ICONOGRAFIA EDITORIAL: REFLEXÕES PARA ATUAÇÃO DO BIBLIOTECÁRIO
Karoline Gomes de Sousa
O cenário editorial é vasto quanto ao âmbito de oportunidades de atuação para os bibliotecários. A cada dia esse mercado vem se configurando como um nicho receptível a esses profissionais, que se beneficiam das suas habilidades nos tratos informacionais, para atuar em diversos eixos do processo das produções editoriais. Desta forma, o bibliotecário pode atuar em vários arquétipos da Editoração desde periódicos científicos, como aponta Farias, Lima e Santos (2018, p. 66), até mesmo em editoras comerciais. Entretanto, observa-se que “No Brasil não há um padrão de segmentação do mercado editorial de livros, o mercado é normalmente segmentado em: obras gerais (OG); livros didáticos (LD); científicos, técnicos e profissionais (CTP) e religiosos (R)” conforme adverte Santos (2017, p.42).
Nesse contexto, o destaque que daremos aqui é justamente para a iconografia editorial, que dentro do mercado de livros didáticos, se mostra um campo ainda a ser explorado pelos profissionais de Biblioteconomia, apesar das correlações entre demandas laborais e o know how deste profissional terem zonas de convergências que possibilitam um panorama fecundo aos bibliotecários. Pois, conforme ressaltam Sousa e Bentes Pinto (2022, p. 142), “[...] no contexto da editoração, a atuação do bibliotecário torna-se indispensável, pois a inclusão desse profissional como parte do processo informacional garante a manutenção dessa dinâmica”.
Para entendermos um pouco o que é esse campo de atuação, antes precisamos relembrar como a iconografia surge. A origem do termo vem do grego onde “eikon” significa imagem e “grafia”, escrita. Desse modo, a iconografia nasce como um estudo sobre a linguagem visual utilizada nas imagens e suas formas de representação. Um dos principais teóricos dos estudos iconográficos foi o alemão Erwin Panofsky que em 1955 apresenta um método instrumentalizado em três etapas para análises e interpretações imagéticas.
Para Panofsky (1991), a iconografia, enquanto ramo da história da arte, contribui para pensarmos no tema da imagem em contraposição à sua forma, pretendendo distinguir, portanto, o significado da mensagem imbuída nas obras pictóricas em divergência ao formato. Com isso, o método panofskyano propõe que as análises iconográficas perpassem a leitura pré-iconográfica – uma descrição superficial da obra; a leitura iconográfica – onde é possível identificar e interpretar a relação dos elementos representados; e por fim, a leitura iconológica que somente ocorre quando através de cruzamentos de informações técnicas, fontes históricas, documentais, culturais, religiosas etc., se alcança o entendimento profundo sobre a obra para determinar o seu significado.
Sobre o método iconográfico de Panofsky, Guimarães (2016, p. 254) destaca que “[...] permite a introdução à linguagem figurativa, possibilita a identificação do tema e também se constitui em ferramenta eficaz para “reconstruir” a obra em suas coordenadas de tempo e espaço”. Partindo dessa premissa, compreendemos em Panofsky que acessar o conteúdo significativo de uma imagem é submergir na teia conceitual trançada pelos contextos sociais, suas relações e interferências da linha temporal em que a obra fora produzida, assim como outros âmbitos da existência humana, a exemplo da língua, cultura, política e religião que atingem diretamente a mensagem a ser representada.
Posto isso, voltaremos nossa atenção para o mercado editorial que se utiliza amplamente de imagens em seus mais diversos aspectos como fotografias, ilustrações, pinturas, tirinhas, dentre outras, para compor as obras produzidas. Nesse sentido, o produto editorial, seja revista, jornal ou livros, é contemplado com iconografias de acordo com sua especificidade, contexto, tipologia, demanda e público-alvo a que se destina.
Perceba que esse é justamente o palco de atuação para o profissional da informação que queremos discorrer, visto que o processo iconográfico editorial passa por uma série de etapas que são desenvolvidas pelo setor de iconografia, desde a pesquisa iconográfica em bancos de imagens, busca de fontes de informação, identificação do usuário, mediação com os editores, indexação de imagens, licenciamento de textos e imagens de terceiros para o devido cumprimento da lei de Direito Autoral, normalização de referências, até a finalização da etapa com a disponibilização de texto e imagens em alta qualidade para a diagramação com a atribuição correta dos créditos.
Todas essas atividades relatadas exigem, acima de tudo, habilidades em informação e carecem de tratamento adequado para o cumprimento do ciclo informacional editorial. Afinal, é inconcebível pensarmos na iconografia de uma obra em desacordo com a linguagem textual comtemplada em seu conteúdo. Nessa circunstância, Campello (2003, p.34) evidencia que “O bibliotecário é a figura central no discurso da competência informacional”. Assim, o protagonismo do profissional da informação ganha visibilidade dentro do processo iconográfico quando lança luz sob os alicerces dos conceitos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação para aprimorar a qualidade da informação, no que tange a necessidade informacional pertinente ao processo, a ser atendida nas representações imagéticas da iconografia editorial.
Em concordância com as atividades atribuídas ao iconógrafo, percebemos que o bibliotecário se prevalece por ter em sua formação acesso a teorias que envolvem fontes de informação, estudos de usuários, normalização, representação temática e descritiva da informação a basilar os conceitos de classificação, indexação e catalogação. Além de fundamentar esse profissional em pilares como a organização e recuperação da informação, assim também quanto à mediação informacional.
Ademais, tendo em vista que o bibliotecário é o responsável pela elaboração de fichas catalográficas, as editoras que comtemplam esse profissional em sua equipe se favorecem, pois atribuem ao bibliotecário iconógrafo essa função para o cumprimento da lei Nº 10.753/2003 que institui a política nacional do livro. Conforme impõe o Art. 6o: “Na editoração do livro, é obrigatória a adoção do Número Internacional Padronizado, bem como a ficha de catalogação para publicação.” (BRASIL, 2003). Desse modo, as editoras agilizam o seu processo com a catalogação na fonte utilizando-se da práxis desse profissional.
Podemos inferir, a partir disso, que o bibliotecário em sua formação desenvolve competências informacionais compatíveis a atender várias das demandas laborais pertinentes ao campo do setor iconográfico, visto que “O conceito de competência informacional envolve, entre outras, a ideia de habilidade de informação” (CAMPELLO; ABREU, 2005, p. 179), o que é amplamente explorado ao longo da graduação em Biblioteconomia. Ora, se temos informação a ser contemplada na iconografia editorial, por meio da linguagem imagética, o bibliotecário se destaca enquanto profissional com competências suficientes para atender as necessidades informacionais do fazer iconográfico.
Com isso, ao revisitarmos o conceito de competência em informação estabelecido por Belluzzo, Santos e Almeida Júnior (2014, p. 63) que o define como “[...] um conjunto de competências e habilidades que uma pessoa necessita incorporar para lidar, de forma crítica e reflexiva, com os diversos recursos informacionais existentes (jornais, revistas, livros, dicionários, enciclopédias, Internet etc.)”, vislumbramos o bibliotecário como um agente categórico a desempenhar atividades críticas e reflexivas na atuação do campo da iconografia editorial, esta que requer deste profissional, como qualquer outra unidade de informação, postura e ações que as explorem, em todas as suas proporções, a aptidão para o uso e disponibilização da informação seja ela de cunho textual ou imagético.
Referência
BELLUZZO, R. C. B.; SANTOS, C. A. dos; ALMEIDA JÚNIOR, O. F. de. A competência em informação e sua avaliação sob a ótica da mediação da informação: reflexões e aproximações teóricas. Informação & Informação, [S. l.], v. 19, n. 2, p. 60–77, 2014. DOI: 10.5433/1981-8920.2014v19n2p60. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/19995. Acesso em: 21 maio 2023.
BRASIL. Lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003. Institui a Política Nacional do Livro. Diário Oficial da União, 2003. Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.753.htm. Aceso em 22 maio 2023.
CAMPELLO, B. O movimento da competência informacional: uma perspectiva para o letramento informacional. Ciência da informação, Brasília, v. 32, p. 28- 37, set./dez 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ci/a/9nQgbdkq5nXsNBLfv5MBHNm/. Acesso em: 25 maio 2023.
CAMPELLO, B. dos S.; ABREU, V. L. F. G. Competência informacional e formação do bibliotecário. Perspectivas em Ciência da Informação, [S. l.], v. 10, n. 2, 2007. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/pci/article/view/23696. Acesso em: 28 maio 2023.
FARIAS, M. G. G.; LIMA, J. S.; SANTOS, F. E. P. Bibliotecário e Editoração: mercado e competências necessárias. Informação & Sociedade: Estudos, [S. l.], v. 28, n. 2, 2018. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/ies/article/view/38682. Acesso em: 28 maio 2023.
GUIMARÃES, F. A. P. Busto-relicário de São Francisco de Xavier: estudo iconográfico e iconológico. In: HERNÁNDEZ, M. H. O.; LINS, E. Á. (Eds.) Iconografia: pesquisa e aplicação em estudos de Artes Visuais, Arquitetura e Design. Salvador: EDUFBA, 2016, pp. 252-267. Disponível em: https://books.scielo.org/id/56qxh/pdf/hernandez-9788523218614-14.pdf. Acesso em: 28 maio 2023.
PANOFSKY, E. Significado nas artes visuais. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1991.
SANTOS, Janiele Moura Lopes dos. Livro digital: estudo de cenários do setor editorial nacional. 2017. 144 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação)-Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2017. Disponível em: https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/tede/9660. Acesso em: 28 maio 2023.
SOUSA, K. G.; PINTO, V. B. A iconografia editorial como nicho mercadológico para o bibliotecário. Páginas A&B, Arquivos e Bibliotecas (Portugal), n. 17, p. 131-146, 2022. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/199685. Acesso em: 28 maio 2023.
Karoline Gomes de Sousa – Mestranda do PPGCI-UFC