ALÉM DAS BIBLIOTECAS


GUERRA E PAZ

Como nossa imaginação não tem limites, diante da Guerra da Ucrânia, ou melhor, da invasão da Ucrânia pela Rússia, há, mais ou menos, cerca de uma semana, diante das imagens midiáticas terríveis de ataque às cidades em, praticamente, todas as regiões ucranianas, em especial, à capital Kiev, busquei na minha coleção de livros, o clássico “Guerra e Paz”, romance histórico da autoria do russo Liev Tolstói, originalmente publicado entre 1865 e 1869, com 1225 páginas, configurando-se como uma das obras mais volumosas da história da literatura universal, em quatro tomos, o qual exige nova leitura.

 

 

Fonte: ISTOÉ Independente

Se Tolstói descreve, minuciosamente, as guerras napoleônicas em seu país, com riqueza de detalhes, incluindo as decorrências psicológicas que afetam os envolvidos, decerto, sentiria vergonha da atitude, considerada, sim, como genocida, do atual ditador da Rússia. Vladimir Vladimirovitch Putin, ex-membro da KGB, o serviço secreto russo extinto em novembro de 1991, começou sua vida profissional na direção do Serviço de Espionagem Russo. Agora, desrespeita os limites de um Estado soberano e legalmente constituído e põe em marcha seu intuito de destruir, total ou parcialmente, o povo ucraniano, mediante avanços contra forças militares e civis, ameaçando com guerra cibernética, e, pior ainda, com arsenais nucleares.

Chocante, por exemplo, um tanque de guerra que, numa avenida larga e vazia passa literalmente por cima do carro de um motorista ucraniano de idade avançada, que se salva milagrosamente. Um ancião confessa em lágrimas a dor de se sentir traído, haja vista que defendera por mais de 30 anos o exército russo, o mesmo que, agora, destruiu, sem dó nem piedade seu pequeno apartamento com seus parcos pertences. São depoimentos chocantes de famílias forçadas a se esfacelar, deixando para trás filhos ou maridos, haja vista que o Governo do ex-ator e comediante Volodymyr Zelensky proibiu os homens ucranianos ou naturalizados, entre 18 e 60 anos, de deixar o país, segundo informação do Serviço de Guarda de Fronteiras do Estado, com o argumento de que precisam permanecer para defender a pátria.

Putin desafia os organismos mundiais. O exemplo mais significativo é a Organização das Nações Unidas (ONU), hoje, com 193 países membros. Instituída, exatamente, após a II Guerra Mundial, no dia 26 de junho de 1945, em San Francisco (Califórnia, Estados Unidos da América), com o fim de preservar a paz mundial e assegurar a segurança entre as nações; promover o respeito às liberdades dos cidadãos e os direitos humanos em geral; agenciar o avanço socioeconômico e cultural dos povos, mediante a cooperação internacional nos mais diferentes segmentos – econômico, social, cultural, esportivo e humanitário –, é por ele ignorada.   O mesmo se dá com a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), aliança militar liderada pelos EUA, criada em 1949, durante a Guerra Fria entre os blocos capitalista e socialista, em oposição à antiga União Soviética, que comandava sua própria aliança militar. Sua meta é garantir a liberdade e a segurança dos 30 países-membros da região do Atlântico Norte por meios políticos e militares.

Se a Rússia não conta com o apoio da maioria das nações, China, Índia e Emirados Árabes Unidos mantêm-se em campo neutro (como se fora isto possível), nenhum dos pretensos “aliados” que apoiou Putin no conflito do Leste Europeu declarou apoio militar àquele país, mediante a remessa de armamento e soldados. São “líderes” ditatoriais, que também oprimem populações e vizinhos. É o caso da Venezuela; Cuba: Nicarágua; Síria e Irã. Bielorrússia e Rússia, por sua vez, são historicamente coligados e integram o chamado Estado da União, de tal forma que a cooperação na esfera da política externa entre eles é sistemática.

Na realidade, as sanções impostas pelos organismos internacionais, ênfase para a ONU, trarão sérias consequências não somente para os habitantes ucranianos, mas para a realidade global, que ainda padece com a pandemia da Covid 19. Sanções econômicas interferem na exportação e importação; na circulação das moedas; na agropecuária; nas indústrias, na comunicação; na aviação, etc. Tudo, com certeza, a troca de mais território e mais poder!

Além do descompasso, morosidade e falta de planejamento no resgate dos brasileiros que residiam no território ucraniano, muitos dos quais ainda estão por lá, o que dizer do problema infindo dos refugiados? Como descrever a dor de bebês, crianças, adolescentes atônitos, deficientes, velhos que deixaram para trás toda uma vida construída segundo a segundo, minuto a minuto, dia a dia?  E a falta de expectativas? Onde encontrar forças para recomeçar? Se, em teoria, a capacidade de recomeçar, quando necessário, faz de cada um de nós, mais fortes e íntegros, decerto, todo e qualquer novo começo demanda a coragem do início; a chance de sonhar sem dor os sonhos perdidos; vencer a sensação insana de fracasso e perdoar a loucura dos mandatários. Eis o reforço das palavras de Tolstói em “Guerra e Paz”, quando diz: “O homem flui. Nele residem todas as possibilidades: ele era estúpido, agora é inteligente; ele era mau, agora é bom; e o contrário. Nisto está a grandiosidade do homem”. Para o autor, o mundo é um lugar pleno de mistérios e de assombrações, com a esperança fugidia de que a tragédia de hoje possa abrir o caminho para o triunfo de amanhã.


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MARIA DAS GRAÇAS TARGINO

Vivo em Teresina, mas nasci em João Pessoa num dia que se faz longínquo: 20 de abril de 1948. Bibliotecária, docente, pesquisadora, jornalista, tenho muitas e muitas paixões: ler, escrever, ministrar aulas, fazer tapeçaria, caminhar e viajar. Caminhar e viajar me dão a dimensão de que não se pode parar enquanto ainda há vida! Mas há outras paixões: meus filhos, meus netos, meus poucos mas verdadeiros amigos. Ao longo da vida, fui feliz e infeliz. Sorri e chorei. Mas, sobretudo, vivi. Afinal, estou sempre lendo ou escrevendo alguma coisa. São nas palavras que escrevo que encontro a coragem para enfrentar as minhas inquietudes e os meus sonhos...Meus dois últimos livros de crônica: “Palavra de honra: palavra de graça”; “Ideias em retalhos: sem rodeios nem atalhos.”