MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO


  • Reflexões sobre a Mediação da Informação, englobando aspectos teóricos e práticos.

TODOS LEMOS, MAS NÃO LEMOS - 1

Muitos, quando perguntamos sobre leitura, se apressam em afirmar que não gostam de ler, que acham chato permanecer muito tempo com algo que exige calma, quietude. Outros, ainda, como mais um dos motivos para a não leitura, dizem que são muito ativos e que não conseguem ficar por muito tempo com um único tipo de ação. Falam, é claro, da leitura de livros, do texto escrito formalizado em suportes tradicionalmente reconhecidos por todos como sendo destinados para a leitura.

 

Esquecem que lemos o tempo todo. O mundo se utiliza da escrita constantemente. Lemos bulas de remédios, rótulos de produtos, outdoors, fachadas de empresas, menus, bilhetes, propagandas em sacolas, folders, filipetas (ou, com se diz em Londrina - e creio que em outros lugares também -, mosquitinhos), manuais de determinados produtos, plásticos e adesivos colados em automóveis, cartazes nas ruas, propagandas em ônibus e metrôs, luminosos com nome da linha de ônibus, etc. (e coloca etc. nisso).

 

Lemos o tempo todo. Já me disseram que, com o uso de ícones nos computadores, a necessidade de leitura havia diminuído muito. Nossa comunicação no ciberespaço continua sendo feita a partir ou tendo como base o texto escrito. E-mails, conversas em chats, msm, toda a gama de formas de redes sociais (Facebook, Orkut, G+, etc.) acontecem via leitura do escrito. Mesmo o uso do Skype, por exemplo, que lida com uma comunicação oral, pressupõe que o usuário entenda seu mecanismo e, a cada momento, para se conectar,  leia as imprescindíveis instruções.

 

Vale lembrar que quando falo em leitura estou me referindo, até aqui, exclusivamente à leitura do texto escrito. Mas, meu entendimento sobre ela é amplo. É possível dizer que há duas grandes formas de se entender a leitura: em um sentido stricto (a leitura do texto escrito) e em um sentido lato (a leitura abrangendo as várias mídias ou formas de expressão: o texto escrito, a imagem fixa, a imagem em movimento e o som).

 

Às vezes, reproduzindo inconscientemente uma concepção tradicional e dominante, valorizamos apenas a leitura do texto escrito, a entendendo como a única que veicula e dissemina a cultura e os bons valores sociais. É preciso cuidado, aliás muito cuidado com essa posição, uma vez que serve ela como forma de manter a sociedade dentro dos moldes atuais e como ferramenta e instrumento para impedir que os interesses e necessidades da maioria da população sejam aceitos ou, ao menos, tenham espaço para serem exteriorizados.

 

Da mesma forma, contrapomos o conhecimento científico e o conhecimento popular. Este, mais empírico, é desconsiderado e vinculado à ingenuidade, à ignorância. Só é válido o conhecimento científico. Apenas os cientistas podem falar em nome da sociedade; apenas eles sabem o que é bom ou não para a humanidade; os caminhos do conhecimento são determinados por eles. A dominação, a busca pelo poder têm muitos tentáculos.

 

Ninguém é obrigado a gostar de ler. Acho que somos obrigados a ler. Dominar o alfabeto, ser alfabetizado, além de todos os argumentos que lhe são favoráveis - e que conhecemos à exaustão -, também deve ser considerado como forma de combater a dominação que eu falava acima. Ler é uma arma de defesa. A leitura também se constitui em uma forma de exclusão. Não apenas uma exclusão boba, isto é, a impossibilidade de acesso ao livro ou a suportes de leitura, mas uma exclusão social, aquela que torna boa parte da população como não-público do texto escrito e, considerando que o poder também se vale da escrita, transformando a população como alijada, marginalizada das condições de cidadania.

 

Sem saber seus direitos, escamoteados nos escaninhos e nos quase indecifráveis textos legais, nos caminhos tortuosos e escuros da burocracia, nos espaços determinados e exclusivos de ascensão social, nos poucos e inatingíveis veículos de comunicação (sempre negados para os movimentos organizados da população marginalizada) a classe popular (a luta de classes não morreu, apesar dos que insistem em defender essa tese) precisa dominar a leitura e a escrita como forma de defesa e, como consequência, de se fazer ver e ter seus interesses respeitados e atendidos.

 

Dizia que ninguém é obrigado a gostar de ler. Será que só a leitura do texto escrito é veiculo do conhecimento humano? Será que só temos acesso a esse conhecimento a partir da leitura e do livro?

 

Sempre (sem exageros: quase sempre) contrapomos o livro e os outros suportes informacionais ou de entretenimento. E pendemos, também sempre (acho que agora o "quase sempre" não cabe, mas não tenho certeza), por considerar o livro como o melhor desses suportes. Por quê? Será que a televisão, por exemplo, é sempre ruim, não tem boa programação? Da mesma forma o rádio, o cinema, o teatro, os quadrinhos, os videogames? E os shows musicais, a conversa com os amigos, o passeio, as viagens?

 

Eu esperava que o que tinha pra dizer terminasse neste texto, mas "garrei na cunversa" e serei obrigado a continuar na próxima coluna. Quem sabe o próximo texto não traga reflexões ampliadas com comentários de leitores sobre o tema?


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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.