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NÃO MARC BOBEIRA, MARC FRBR COM A CATALOGAÇÃO

Desde a Conferência de Paris, ocorrida em 1961 [conhecida como “Princípios de Paris”], que a teoria e a prática da catalogação tem sido revista e discutida internacionalmente, com vista à construção normatizada dos dados bibliográficos. Em 1969, na cidade de Copenhague, ocorreu a Reunião Internacional de Especialistas em Catalogação (RIEC), no qual se aprovou uma resolução-chave para o estabelecimento de normas internacionais em relação à forma e ao conteúdo dos registros bibliográficos, a prescrição de pontuação padronizada [Internacional Standard Bibliographic DescriptionISBD]. Estes eventos do passado foram de grande importância, entre outras, para a automação da biblioteca e do compartilhamento de dados bibliográficos, independente do seu aspecto linguístico e cultural, aspecto vital ao controle bibliográfico e a melhor disseminação do conhecimento registrado. Os princípios formulados e agregados nesses Encontros, também estão entremeados na estrutura de uma variedade de códigos de catalogação, em especial do AACR2, código adotado no Brasil.

 

As bases da catalogação bibliográfica são inteligentemente construídas e focadas em um processo simples, mas consistente de organização do conhecimento. Assim, não dá para ficar de “bobeira” diante da necessidade de planejar a estrutura de um serviço de informação bibliográfico, principalmente quando se quer inserir esse serviço no contexto das inovações atuais, baseadas em redes eletrônicas.

 

Ademais, ao longo das últimas 5 (cinco) décadas, o ambiente de aplicação dos princípios e das normas de catalogação mudaram radicalmente. O fator chave de mudança foi a introdução, desenvolvimento e popularização dos sistemas automatizados (já frisado). Também o crescimento das bases de dados contendo registros criados e compartilhados por milhares de bibliotecas participantes dos serviços de catalogação cooperativa. Acrescente-se a isto, talvez o fundamental, a necessidade de adaptar os códigos e práticas catalográficas às novas formas documentais eletrônicas, ao surgimento da Internet e do acesso aos recursos de informação remota.

 

Em 1990, na cidade de Estocolmo, realizou-se o “Seminário sobre Registros Bibliográficos”, patrocinado pelo “Programa do Controle Bibliográfico Universal” e o “Seminário Internacional MARC”. Desse encontro, entre as várias resoluções adotadas, definiu-se a realização de estudos sobre os requisitos funcionais dos registros bibliográficos para se delimitar as funções desempenhadas pelos registros em relação à diversidade documental e de necessidades dos usuários. Neste cenário, tornou-se fundamental entender o que é um registro bibliográfico, que informação deve fornecer como resposta às necessidades dos usuários.

 

Em 1997, na 63ª Conferência Geral da IFLA, é apresentado e aprovado o relatório final dos estudos propostos em Estocolmo. Posteriormente é publicado sob o título: Funcional Requirements for Bibliographic Records: final report – FRBR.

 

Há este fato, Mey e Silveira (2009: p. 87) comentam que os FRBR transformam-se em marco da catalogação contemporânea, em especial pelas suas características teóricas, e sua base fundamentada nas tarefas realizadas pelos usuários, na construção de nova terminologia na área, e consequente revisão das ISBDs e dos códigos de catalogação.

 

Modelo FRBR identifica três grupos de entidades:

 

Entidade do grupo 1: Produtos do trabalho intelectual ou artístico. Entidade: obra, expressão, manifestação, item.

 

Entidade do grupo 2: Responsáveis pelo conteúdo intelectual ou artístico, a produção física e a disseminação das entidades do grupo 1.

 

Entidade do grupo 3: Assuntos. Entidades: conceito, objeto, acontecimento, lugar, mais todas as entidades dos grupos 1 e 2.

 

Entidades do grupo 1:

§  Obra: Uma criação intelectual ou artística definida. Conteúdo intelectual independente do seu suporte ou forma.

§  Expressão: A realização intelectual ou artística de uma obra na forma como se expressa. texto, musical ou coreográfica, som, imagem, objeto, movimento, etc., ou qualquer combinação destas formas. Compreende tradução, interpretação.

§  Manifestação: Materialização em termos físicos da expressão de uma obra. Representação de todos os objetos físicos que possuam mesma característica (conteúdo e forma).

§  Item: Um exemplar individual de uma manifestação. Objeto físico que permite ao usuário acessar o conteúdo intelectual ou artístico. Compreende objeto existente em um lugar (mesmo ciberespaço) e pode constituir-se de vários volumes.

 

Em 2001, a Network Development and MARC Standards Office lançou a publicação Displays for Multiple Versions from MARC 21 and FRBR, que descreve como o modelo FRBR pode ser usado para a recuperação do registro bibliográfico. Trata-se de uma ferramenta para exibição FRBR que transforma os dados bibliográficos encontrados em arquivos de registro MARC, agrupando-os na entidade 1: Obra, Expressão e Manifestação. O documento orienta a construção de algoritmos para emular a modelagem por um software catalográfico.

 

Este texto, baseado no documento citado, faz uma síntese (básica) de algumas das etiquetas do MARC utilizadas para a modelagem do FRBR. O objetivo é realçar a compreensão e a importância de o bibliotecário seguir padrões bibliográficos no desempenho de sua atividade, especialmente no processo de inserção tecnológica da biblioteca no contexto atual das redes digitais.

 

A aplicação da etiqueta MARC à modelagem do FRBR

 

Ao nível da autoria – criador é a pessoa, família ou entidade responsável pela a criação de uma obra. Nas etiquetas do MARC os dados são extraídos da combinação dos seguintes campos e respectivos subcampos:

 

§  100 – Entrada Principal – Nome Pessoal (Não Repetitivo)

o   $a – Nome pessoal (NR)

o   $b – Numeração (NR)

o   $c – Títulos e outras palavras associadas ao nome (R)

o   $d – Datas associadas ao nome (NR)

o   $q – Forma completa do nome (NR)

§  110 – Entrada Principal – Nome da Entidade Corporativa (NR)

o   $a – Nome da entidade ou lugar (NR)

o   $b – Unidades subordinadas (R)

o   $c – Local de realização do evento (NR)

o   $d – Data da realização do evento (R)

§  111 – Entrada Principal – Nome do Evento (NR)

o   $a – Nome do evento ou lugar (NR)

o   $c – Local de realização do evento (NR)

o   $d – Data de realização do evento (NR)

o   $q – Nome do evento que segue o nome da jurisdição (NR)

Os campos relacionados com a autoria são apresentados sob o rótulo: Autor.

 

Quanto ao nível do título da Obra, as combinações seguem a seguinte ordem de campos:

 

§  240 – Título uniforme / original para a obra (Não Repetitivo)

o   $a – Título uniforme (NR)

o   $d – Data da assinatura do tratado ou acordos entre governos (R)

o   $l – Idioma da obra (NR)

o   $m – Meio de execução para música (R)

o   $n – Número da parte/seção da obra (R)

o   $p – Nome da parte/seção da obra (R)

o   $r – Escala musical (NR)

§  243 – Título Uniforme Coletivo (Título de Coletânea) (NR)

o   $a – Título uniforme (NR)

o   $d – Data da assinatura do tratado ou acordos entre governos (R)

o   $l – Idioma da obra (NR)

o   $m – Meio de execução para música (R)

o   $n – Número da parte/seção da obra (R)

o   $p – Nome da parte/seção da obra (R)

o   $r – Escala musical (NR)

§  245 – Título Principal (NR)

o   $a – Título principal (NR)

o   $n – Número da parte/seção da obra (R)

o   $p – Nome da parte/seção da obra (R)

 

A definição do título somente inclui o campo 130 quando, na Obra, não existir dados para preenchimento dos campos: 100,110,111.

 

§  130 – Entrada Principal - Título Uniforme (NR)

o   $a – Título uniforme (NR)

o   $d – Data da assinatura do tratado ou acordos entre governos (R)

o   $m – Meio de execução para música (R)

o   $n – Número da parte/seção da obra (R)

o   $p – Nome da parte/seção da obra (R)

o   $r – Escala musical (NR)

Os campos relacionados com o título são apresentados sob o rótulo: Obra

 

Na definição da Expressão da Obra, o dado é extraído da combinação dos campos Líder (Leader)/06 (tipo de registro) e Campo 008/35-37 (campos fixos de dados: Idioma)

 

Líder (Leader)/06 - Tipo de registro: contém um caractere que define as características e os componentes do registro; é utilizado para diferenciar os registros MARC criados para vários tipos de conteúdos e materiais:

 

·         a - Material textual

·         c - Música impressa

·         d - Música manuscrita

·         e - Material cartográfico impresso

·         f - Material cartográfico manuscrito

·         g - Mídia projetável

·         i - Gravação de som não musical

·         j - Gravação de som musical

·         k - Material gráfico bidimensional não projetável

·         m - Arquivo de computador

·         o - Kit

·         p - Material misto

·         r - Artefatos tridimensionais ou objetos da natureza

·         t - Manuscrito

 

008 – Campo de Tamanho Fixo (NR): a posição 35-37: Idioma do conteúdo do documento. Contém um código com três caracteres alfabéticos que indicam o idioma predominante da Obra. A fonte do código é MARC Code List for Languages.

 

·         Forma de apresentação: Líder (Leader)/06 – 008/35-37

 

Definição de Manifestação da Obra.

 

Não há combinação ao nível da manifestação. Os registros bibliográficos são ordenados cronologicamente pela data usando o valor do campo 008/07-10: (Data 1/Data inicial da publicação)

 

O registro é mostrado na sequência:

 

Edição: 250 – Edição (NR)

 

$a – Edição (NR)

$b – Complemento da informação da edição (NR)

 

Título da Edição: 245 – Título (NR)

 

$a – Título (NR)

$b – Complemento do título (NR) [se o subcampo $b começar com um   parênteses ou colchete, não será mostrado]

$n – Número de parte/seção da obra (R)

$p – Nome de parte/seção da obra

 

Indicação de responsabilidade: 245 – Título (NR)

 

$c – indicação de responsabilidade (NR)

 

Imprenta: 260 Imprenta (NR)

 

$b – Nome do editor, distribuidor, etc. (R)

$c – Data de publicação, distribuição, etc. (R)

$g – Data de manufatura (NR)

 

Descrição Física: 300 – Descrição física (R)

 

$a – Extensão (R)

$b – Outros detalhes físicos (NR)

$c – Dimensões (R)

$e – Material complementar (NR)

$f – Tipo de unidade (R)

$g – Tamanho da unidade (R)

[todos os subcampos, exceto: $6, $8]

 

ISBD: 020 – ISBN – International Standard Book Number (R)

 

$a – ISBN (NR)

$c – Termos de avaliação (NR)

$z – ISBN cancelado/inválido (R)

 

ISSN: 022 – ISSN – International Standard Serial Number (R)

 

$a – ISSN (NR)

$y – ISSN incorreto

$z – ISSN cancelado

 

Número do Editor para música: 028 – Número do Editor para música (R)

 

$a – Número do editor (NR)

$b – Fonte (NR)

 

Identificador Título de Periódicos: 030 – Número CODEN (R)

 

$a – CODEN (NR)

$z – CODEN cancelado/inválido (R)

 

Reprodução: 533 – Nota de Reprodução (R)

 

$a – Tipo de reprodução (NR)

$b – Local de reprodução (R)

$c – Instituição responsável pela reprodução (R)

$d – Data de reprodução (NR)

$e – Descrição física da reprodução (NR)

$f – Informação série da reprodução (R)

$m – Datas de publicação e/ou indicação de sequência para  fascículos reproduzidos (R)

$n – Nota sobre a reprodução (R)

[todos os subcampos exceto $6, $7, $8]

 

Exemplos de apresentação, utilizados pela Library of Congress, e aqui replicados com pequenas alterações para ilustração da modelagem citada:

 

·         Autor: Rhys, Jean

·         Obra: Wide Sargasso Sea

·         Forma: texto - Inglês

o   Edição: 1st ed.

§  Título: Wide Sargasso Sea

§  Indicação de responsabilidade: Jean Rhys ; backgrounds, criticism edited by Judith L. Raiskin.

§  Imprenta: W.W. Norton, c1999

§  Descrição física: xiii, 270 p. : ill., map ; 22 cm.

§  ISBN: 0393960129 (pbk.)

o   Edição:

§  Título: Wide Sargasso Sea

§  Indicação de responsabilidade: Jean Rhys ; introduction by Francis Wyndham.

§  Imprenta: Thorndike Press, 1994

§  Descrição física: 231 p. (large print) ; 23 cm.

§  ISBN: 0786200731 (acid-free paper)

 

·         Autor: autor não determinado

·         Obra: King of Queens. Educating Doug

·         Forma: imagem em movimento – Inglês

o   Edição:

§  Título: King of Queens. Educating Doug

§  Indicação de responsabilidade: directed by Rob Schiller ; written by Cathy Yuspa, Josh Goldsmith.

§  Imprenta: CBS-TV, 1998

§  Descrição física: 1 videocassette of 1 (ca. 30 min.) : sd., col. ; 3/4 in. viewing copy.

 

Exemplo de Registro Bibliográfico (Item) codificado em MARC com mapeamento FRBR (entidades do grupo 1), extraído da Library of Congress.

 

Tag

Subcampos

Mapeamento FRBR

000

01465pam a2200385 a 450

Controle do Registro

001

3384005

Controle do Registro

008

880915s1989 enka b 001 0 eng

Manifestação, Expressão

020

$a 0521361834

Manifestação

100 1#

$a Montesquieu, Charles-Louis de  Secondat,

$c Baron de La Brède et de,

$d 1689-1755

Pessoa física (Autor) criado por” relação com a Obra

240  10

$a De l’esprit des lois. $l English

$a=Obra $l=Expressão

245  14

$a The spirit of the laws /

$c Montesquieu ; translated and edited by Anne M. Cohler, Basia Carolyn Miller, Harold  Samuel Stone

Manifestação

260 ##

$a Cambridge;

$a New York :

$b Cambridge University Press,

$c 1989

Manifestação

300 ##

$a xlvii, 757 p. : $b ill, ; $c 22 cm.

Manifestação

500 ##

$a Tradução de: De l’espirit des lois.

Expressão

650 0#

650 0#

$a Ciência política

$a Direito $x Filosofia

Conceitos

Relação “de assunto’ com a Obra

700 1#

700 1#

700  1#

$a Cohler, Anne M.

$a Miller, Basia Carolyn

$a Stone, Harold Samuel, $d 1949

Pessoa física

Relação de “realizado por” com esta Expressão

 

        Autor: Montesquieu, Charles-Louis de  Secondat

        Obra: De l’esprit des lois

        Forma: texto - Inglês

o        Edição:

        Título: The spirit of the laws

        Indicação de responsabilidade: Montesquieu ; translated and edited by Anne M. Cohler, Basia Carolyn Miller, Harold  Samuel Stone.

        Imprenta: Cambridge University Press, 1989

        Descrição física: xlvii, 757 p. : ill. ; 22 cm.

        ISBN: 0521361834

 

Com a sociedade interconectada em redes sociais, impactadas pelas tecnologias da informação e comunicação, obrigam que às bibliotecas no desempenho de suas atividades de catalogação se renovem, e universalizem seus produtos e serviços por meio da adoção de processos baseados em padrões de normalização. Padrões que estimulem adoção de formatos bibliográficos inovados ou fundamentados, em seu desenvolvimento, em princípios teóricos e práticos aceitos na área. Aspectos que têm efeitos significativos sobre o acesso e recuperação da informação. Vivemos uma fase de muita inovação e criatividade para o trabalho bibliotecário, mas não de invencionices na estruturação de serviços de informação.

 

Indicação de leitura:

Mey, Eliane S. A.; Silveira, Naira C. Catalogação no plural. Brasília, DF : Briquet de Lemos/Livros, 2009.

 

Network Development and MARC Standards Office Library of Congress.  Displays for Multiple Versions from MARC 21 and FRBR. Disponível em: http://www.loc.gov/marc/marc-functional-analysis/multiple-versions.html

 

Maranhão, Ana Maria N.; Mendonça, Maria de Lourdes S. MARC 21:Formato Bibliográfico. Rio de Janeiro : Divisão de Bibliotecas e Documentação - PUC-Rio, 2010. Disponível em: http://www.dbd.puc-rio.br/MARC21/


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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.