PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA


  • A prática profissional e a ética voltadas para a área da Ciência da Informação.

PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA: DA AUTORIDADE PROFISSIONAL À SUBMISSÃO MORAL

O primeiro sinal de autoridade profissional exposta à sociedade nacional pelo bibliotecário brasileiro deu-se pela criação do Curso de Biblioteconomia do Departamento de Cultura do Município de São Paulo na segunda metade da década de 1930. Tinha um senão: importava dos Estados Unidos da América todo o modelo formal de organização bibliotecária e de ensino de Biblioteconomia. O segundo sinal foi dado pela criação da Associação Paulista de Bibliotecários, logo em seguida, com a participação intensiva dos primeiros egressos do Curso. Tinha também um senão: a crença de Rubens B. Moraes de que no Brasil necessitava-se de uma ALA (American Library Association) nativa. Ocorre que o Brasil não foi não é e não será, cultural e moralmente,  o lugar de onde o modelo de Curso e de Associação recém referidos veio. O Brasil, na década de 1930 e seguintes, até os dias atuais, continua a ser um país onde o efeito devastador do modelo de donataría (ver as explicações contidas no clássico os Donos do Poder, de Raymundo Faoro), ou onde a sustentação secular da Casa Grande (Capitalista ou dono da Fazenda)  sobre a Senzala (os escravos negros dos séculos XVII a XIX ou atualmente os assalariados), cujas explicações podem ser buscadas em  Gilberto Freyre, em seus clássico: Casa Grande & Senzala, ou ainda o país onde o Pilantrismo benquisto (conforme as explicações de Sérgio Buarque de Holanda em seu clássico Raízes do Brasil) proliferam. E essas condutas perpassam todas as áreas profissionais, umas mais outras menos. Perpassa sobre o nosso modelo político parlamentar  e de política profissional.

 

Nossas Associações de Bibliotecários e nossos Cursos de Graduação em Biblioteconomia, embora provindos do modelo originado nos Estados Unidos da América  não puderam incorporar valores culturais do ambiente pragmático em termos econômicos, e liberal em termos políticos daqueles norte-americanos. Está ai para demonstrar tais distâncias do modo como funciona o capitalismo à brasileira dependente e submisso (e Celso Furtado na obra clássica Formação Econômica do Brasil esclarece suficientemente) o papel assumido nos últimos governos de ser o Brasil uma plataforma de fornecimento de matérias primas para a China e outras nações compradoras. De fazer superávit vendendo minérios e grãos quando poderia vender produtos processados e com mais valor incorporado. Mas saindo dessa exemplificação e analisando como vimos nos desenvolvendo profissionalmente, podemos perceber que o próprio bibliotecário que ajuda a implantar o Curso de Biblioteconomia e a primeira Associação Profissional e suas co-irmãs que, como conjunto de entidades de defesa dos interesses de uma categoria de trabalhadores sociais, leva à criação da Federação de Associações (FEBAB) compreende que há uma lógica que o submete moralmente. Esse bibliotecário vai perceber que o modelo cujas explicações Faoro, Freyre, Holanda e Furtado oferecem não vai ser superado somente porque certas estruturas do pragmatismo biblioteconômico dos Estados Unidos da América foram aqui copiadas. Ao se dar conta disso, e pela liderança de Laura Russo, esse bibliotecário enxerga que tem que se “agarrar”: 1) aos Donos do Poder para formar sua donataria, claramente objetivada na Legislação profissional do bibliotecário brasileiro; e 2) à Casa Grande para ser aceito como categoria profissional à disposição dessa. Igualmente, percebe ter que aceitar ou simular que aceita o jogo dos mandachuvas e tem que conhecer, ao menos, que é parte de uma linha auxiliar histórica dos interesses capitalistas internacionais nos anos 1950 – 1970 (para o que a Ciência da Informação, via profissionais atuantes no antigo IBBD, toma a frente).

 

Esse quadro histórico, político, social e econômico que recusa ao bibliotecário vir a conservar como fato o que estava em seus sinais de autoridade, fragilmente estabelecidos, o leva a reassimilar e enrijecer os fenômenos que colocam a corporação estatal origem e modelo do poder público brasileiro pela herança dos donos do poder, pela força da casa grande, pela desfaçatez da burocracia, pela submissão econômica do trabalhador mesmo especializado dentro de seu cotidiano.

 

Então, esse bibliotecário situado nesse quadro histórico virá a adotar uma Legislação específica, como o seu centro de autoridade profissional diante da sociedade brasileira. Coloca, portanto, o Conselho Federal (e seus Regionais) de Biblioteconomia (CFB) como o lugar da legitimação estatal da categoria profissional.

 

Mas é preciso entender que o Conselho é, por definição, um órgão descentralizado do Poder Executivo Federal, que cumpre funções do Ministério do Trabalho e do Emprego dentro do corpo da profissão regulamentada. É, por isso, um instrumento dos Donos do Poder e da Casa Grande. É, em outros termos, um simulacro de Delegacia do Trabalho cumprindo as funções de registro e fiscalização do exercício profissional dentro das respectivas categorias  profissionais que mantém o status de profissão regulamentada. Para confirmar isso, isto é, o papel de burocracia estatal, o não pagamento da anuidade por profissional em exercício de sua atividade equivale a qualquer outra inadimplência para com o Governo Federal.


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FRANCISCO DAS CHAGAS DE SOUZA

Docente nos Cursos: de Graduação em Biblioteconomia; Arquivologia; Mestrado e Doutorado em Ciência da Informação da UFSC; Coordenador do Grupo de Pesquisa: Informação, Tecnologia e Sociedade e do NIPEEB