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A CARA DA BIBLIOTECA NA PRÓXIMA GERAÇÃO DO OPAC

Um dos canais de comunicação entre a biblioteca e a sua comunidade usuária é o catálogo. Com a internet e a evolução da web, o catálogo torna-se cada vez mais essencial para a visibilidade dos produtos e serviços bibliotecários.

 

O questionamento suscitado é se as bibliotecas exploram bem este canal de interação com o público.  Se a questão gera dúvida no leitor, é provável que esteja acessando pouco os OPACs e muito os mecanismos de busca, na web. Neste caso só o Google explica. E a explicação pode estar na preocupação que bibliotecários devam ter com uma nova geração de catálogo eletrônico, que também pode representar a sobrevivência da própria biblioteca.

 

Recorde-se que nos anos de 1980, segundo Hildreth, os OPACs podiam se dividir em três gerações ou categorias de interface:

 

  • Primeira geração: nasce com a automação dos catálogos impressos. O acesso à informação bibliográfica era limitado como os catálogos de fichas (acesso por ordem alfabética das letras iniciais dos índices de cabeçalhos de assunto, autores e títulos). A interface de interação realizada era por menu.
  • Segunda geração: incluía algumas funcionalidades, basicamente, de recuperação da informação, como acesso por palavra-chave ou busca em texto completo. Adotava princípios da pós-coordenação para recuperação da informação. Passa a oferecer a possibilidade de usar comandos e operações booleanas.
  • Terceira geração: combinou funcionalidades das duas gerações anteriores, assim como maior funcionalidade nos recursos de busca, uso de menus e de telas de ajuda.

 

Os anos de 1980 marcam evoluções nos sistemas com projetos que melhoram a funcionalidade. Projetos amadurecidos por meio de protótipos acadêmicos e comerciais desenvolvidos com vista a superar as dificuldades que os usuários tinham no uso do OPAC, mediante adoção de ajuda contextualizada e melhoramento na organização e recuperação da informação.

 

No início dos anos de 1990, pesquisas sobre o tema destacam as características desejáveis para um “bom” OPAC e que, segundo Tague, deveria oferecer:

 

  • Capacidade para apresentar a maior quantidade possível de itens relevantes ou úteis de bases de dados. – Alta exaustividade.
  • Capacidade para recuperar itens relevantes em vez dos não relevantes. – Alta precisão.
  • Facilidade de aprendizagem e uso.
  • Rapidez de resposta.
  • Flexibilidade e a potência, quer dizer, a capacidade para entender distintos usuários.
  • Baixo custo.

 

Algumas características podem parecer contraditórias. Baixo custo, por exemplo, pode estar associado a sistemas de pouco desempenho. Porém, o que se sobressaia nas características era a ênfase dada à busca por assunto.

 

Com a internet, os OPACs ganham mais importância pelo valor agregado que adicionam ao produto que transmitem. Sabe-se que na Internet tudo está, mas ao mesmo tempo é muito mais difícil de encontrar. Neste aspecto, o valor agregado do catálogo eletrônico decorre do fato de ser uma base de dados estruturada em campos, constituída por critérios de descrição definidos e padronizados segundo regras catalográficas, e que coletam documentos autenticados por serem catalogados em centros ou agências documentais reconhecidas.

 

De outro lado, segundo Thomas, o OPAC poder ser visualizado como portal para acesso a Internet ou outras fontes de informação acessíveis através dele. Assim, o OPAC tem esse valor agregado de adaptar-se ou integrar-se nos vários canais de informação acessível por meio da web. Possibilidade de servir como meio de acesso a distintos recursos (mediante links ou estabelecimento de estratégias de busca a outras bases de dados, além do próprio catálogo, bem como de mecanismos de busca).

 

O OPAC na sua evolução deixa de ser uma mera janela na qual o usuário visualiza exclusivamente as referências dos materiais contidos na coleção da biblioteca. O Catálogo vai se transformando em um mirante para ambientes informacionais. E é importante que assim se transforme, até para minimizar o consenso social de que a Internet tudo prove, tornando desnecessária a função da biblioteca.

 

Já não é, portanto, nenhuma surpresa os comentários sobre a extinção dos catálogos online em sua configuração tradicional de objetivos. A percepção da obsolescência de suas funções é influenciada pela Internet, os mecanismos de busca, a proliferação de textos eletrônicos com acesso completo, as iniciativas de descrição baseadas em metadados e não na descrição tradicional (de alto custo), a tendência à simplicidade imposta pelos estudos de usuários.

 

Fatores a ressaltar limitações de uma ferramenta basicamente destinada para automatização dos antigos catálogos em ficha. Campbell & Fast comentam estudos comparativos entre mecanismos de busca (Google) e OPAC; nos quais destacaram que os usuários mostram desorientação e frustação no uso do catálogo online, apesar do reconhecimento quanto a organização da informação. Os usuários destacavam não serem capazes de utilizar tal organização para acesso à informação por falta de experiência e paciência. Comentavam que, no caso dos mecanismos de busca, o acesso simples e linear aos resultados permitia navegar, conhecer o vocabulário e obter um primeiro ponto de acesso a uma variedade de fontes de informação.

 

Em consequência dos acontecimentos, atualmente busca-se desenvolver OPACs cada vez mais simples de utilizar e cobrindo uma maior variedade de materiais, além de formatos de apresentação dos registros distantes do design ISBD.

 

Neste contexto que, no universo das bibliotecas, ressalta discussões sobre a nova geração de catálogos. Emerge conceitos como, por exemplo, “catálogo de biblioteca 2.0”. Apesar dos questionamentos e opiniões, vai se formando um consenso sobre algumas das características que a próxima geração de catálogos deveria contemplar.

 

Yang e Hofmann comentam que nos últimos três anos (2007-2009), bibliotecas, fornecedores comerciais e a comunidade do código aberto têm intensificado esforço no desenvolvimento de OPAC dotado de recursos avançados. Uma tentativa de tornar a próxima geração de catálogos bibliográficos em algo atual. É neste sentido, que a comunidade bibliotecária tem aderido aos sistemas integrados de código aberto evidenciado pela popularidade crescente do Koha e Evergreen, por exemplo. Tais sistemas implementam inovações.

 

Os autores salientam estudos sobre a comparação de OPACs, envolvendo análise do modelo da Amazon, no que se refere a aspectos de pesquisa, apresentação de resultados, conteúdo enriquecido, participação dos usuários, personalização de consulta e aplicação de tecnologia web 2.0. Os resultados indicam que há catálogos de bibliotecas com progressos substanciais na implantação de novas características, porém com melhor destaque no conteúdo e menor desempenho na participação dos usuários e personalização da consulta.

 

Outro estudo comentado também pelos autores, se refere a avaliação realizada junto aos bibliotecários norte-americanos sobre o grau de satisfação no uso de sistemas integrados de bibliotecas baseados em software livre e proprietário. A avaliação envolveu quesitos como: facilidade de utilização, completeza na busca de recursos, facilidade do usuário realizar serviço de autoatendimento online (solicitação, renovação e consulta). Os resultados apontam com destaque para os sistemas de código aberto, especialmente o Koha.

 

Sobre a visão dos bibliotecários para um catálogo moderno, as dez características emanadas das pesquisas foram:

 

  1. Ponto de entrada único para toda informação da biblioteca. A nova geração de catálogo não conterá só informação bibliográfica sobre livros impressos, vídeos e títulos de periódicos, mas acesso a texto completo das bases de dados eletrônicas, repositórios digitais, bem como qualquer outro recurso da biblioteca. Realização de busca de texto integral de livros eletrônicos e artigos de periódicos e realização de busca federada.
  2. Interface web. Catálogos devem ter “interface intuitiva” e “visualmente atraente” que se comparam com as interfaces dos mecanismos de busca da internet. Pode assemelhar-se ao Google, Amazon e outros sites populares. Embora alguns pesquisadores considerem este critério subjetivo, pois os usuários podem não visualizar no Google ou Amazon um ambiente intuitivo e de fácil consulta.
  3. Conteúdo enriquecido. Catálogos tradicionais oferecem registros em formato MARC ou em texto. Uma nova geração de catálogos deve trazer conteúdo de fontes variadas para reforçar o apelo visual e a quantidade de informação ofertada ao usuário. O conteúdo enriquecido inclui imagens de livros, CDs, filmes, tabelas, índices, resumos e fotos de itens não presentes nos catálogos tradicionais existentes.
  4. Navegação facetada. Permitir aos usuários reduzirem os resultados de busca por facetas. As facetas podem incluir assuntos, autores, datas, tipos de materiais, locais, séries, e outras opções de categorias. Algumas ferramentas de pesquisa e mecanismo de busca federada, como Villanova University VuFind e Innovative Interfaces Encore têm usado esta tecnologia nas pesquisas. Auto-Graphics também aplicam este recurso em seu OPAC: Agent Iluminar.
  5. Caixa de pesquisa simples por palavra-chave. Catálogos futuros devem operar semelhante aos mecanismos de busca mais populares da internet. O melhor exemplo de interface de usuário é o Google. Isso significa que uma caixa de busca por palavra, em vez de uma caixa com campos específicos ou de vocabulário controlado deve ser apresentada ao usuário na página de abertura com um link para opção de busca mais complexa ou avançada.
  6. Relevância. O tradicional ranking de resultados de pesquisa é baseado na frequência e nas posições dos termos nos registros bibliográficos durante as buscas de palavra-chave. A relevância não tem funcionado bem nos OPACs. Além disto, a popularidade é outro aspecto que não tem sido considerado no ranking de relevância da coleção de livros da biblioteca, por exemplo: o número de vezes que um item foi consultado poderia ser considerado indicador de popularidade. Do mesmo modo, a dimensão e a fonte de letras das palavras em uma nuvem de tags (etiquetas) ou o número de comentários dos usuários anexado ao item, também pode ser considerado relevante no ranking de resultados de uma pesquisa.
  7. Você quis dizer? Quando um termo de pesquisa não foi digitado corretamente ou nada é encontrado no catálogo durante uma pesquisa por palavra, um verificador ortográfico entra em ação sugerindo grafia correta ou recomendando um termo que possa corresponder ao termo de busca desejado pelo usuário. Por exemplo, um moderno catálogo pode gerar uma indicação do tipo: “você quis dizer...?” ou “talvez você queira dizer...?”. Este pode ser um serviço muito popular e útil em OPACs modernos.
  8. Recomendações e materiais relacionados. Um modelo de catálogo visualizado como promotor de leitura e de aprendizagem, realizando recomendações de outros materiais relacionados ao interesse do usuário. Este recurso é uma imitação do catálogo da Amazon e de outros sites de comércio eletrônico ao afirmar que: “os clientes que compraram este artigo também compram...”. Da mesma forma, no OPAC após uma pesquisa, poderia aparecer declaração do tipo: “usuários que emprestaram este item também emprestaram os seguintes materiais...”.
  9. Contribuição do usuário. Avaliações, opiniões, comentários e etiquetagem dos registros pela comunidade usuária são restritos nos catálogos tradicionais. Inclusão de conteúdos é permitida só aos catalogadores. Nos catálogos de próxima geração, os usuários poderão ser colaboradores ativos no conteúdo, realizando avaliação, produzindo resenhas, etiquetando conteúdos e incluindo comentários. A contribuição dos usuários será indicador importante de uso, bem como indicador utilizado no ranking de relevância.
  10. RSS. Um catálogo moderno deve ser dinâmico por fornecer lista de novas aquisições e atualização de busca para o usuário através de feeds RSS. Fazem mais do que simplesmente mostrar um resultado de busca.

Concluindo

 

O catálogo da biblioteca não é um catálogo igual a qualquer outro, mas uma ferramenta projetada para tornar mais fácil ao usuário realizar suas pesquisas, de maneira a localizar de forma eficaz, dados ou informações que possa utilizar. Neste sentido, os catálogos online de acesso público tanto podem espelhar o serviço bibliotecário adaptado ao ambiente tecnológico e realizado de forma inovadora, quanto pode retratar, na sua interface, certo arcaísmo do serviço. Sou favorável pela inovação sempre, ainda que erros ou equívocos possam ser cometidos.

 

Indicação de leitura:

 

Yang, S. Q.; Hofmann, M. A. The next generation library catalog: a comparative study of the OPACs of Koha, Evergreen and Voyager. Information Technology and Libraries, vol. 29, n. 3, p.141 -149, Sep. 2010.

 

Hildreth, C. R. User feedback in the design process. In: Brian Aveney (ed.) Online catalog design issues. Washington D.C. : Council on Library Resources, 1984.  p. 67 – 102.

 

Tague, J. M. Negotiation at the OPAC interface. In: Charles R. Hildreth (ed.). The online catalogue: developments and directions. London : The Library Association, 1989. p. 47 – 60.

 

Thomas, S. E. The catalog as a Portal to the Internet. In: Bicentennial Conference on Bibliographic Control for the New Millennium: Confronting the Challenges of Networked Resources and the web, 2000. http://www.loc.gov/catdir/bibcontrol/thomas.html

 

Campbell, D. G.; Fast, K. V. Panizzi, Lubetzky and Google: how the modern web environment is reinventing the theory of cataloguing. Canadian Journal for Information and Library Science, n. 3, p.25 – 38, 2004.

 

Garcia Lópes, G. L. Los sistemas automatizados de acceso a la información bibliográfica: evaluación y tendências em la era de internet. Salamanca : Ediciones Universidad de Salamanca, 2007.


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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.