PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA


  • A prática profissional e a ética voltadas para a área da Ciência da Informação.

PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA: A QUE DISTÂNCIA O CÓDIGO DE ÉTICA DO CFB VÊ O USUÁRIO OU CLIENTE DOS SERVIÇOS PROFISSIONAIS DO BIBLIOTECÁRIO?

Consideremos como ponto de partida desta reflexão, que sendo produtores de concepções sobre o que é real e concreto, todos os humanos ao viverem em um ambiente social só as produzem para outrem também humanos e viventes em sociedade. Se eles forem bem formados moralmente, orientados pelos bons princípios éticos, eles transformam essas concepções em boas representações verbais ou discursivas de boas intenções. Ao agirem assim, eles situam sua existência num mundo de “nós”, de rede, de sociedade. Quer dizer, se esses “todos humanos” somos nós, então deveríamos agir como tal, potencializando e valorizando a presença de todos por todo o tempo, independentemente do espaço onde estejamos situados.

 

No discurso funcionalista da prática e no discurso da ética das profissões, essa possibilidade de agirmos como nós se esvai, na medida em que cada categoria postula uma identidade de grupo que tende a dar equivalência à noção “todos os humanos”, ao conjunto de indivíduos que portam as mesmas habilidades ocupacionais ou o mesmo domínio de conhecimento ou as mesmas credenciais fornecidas por uma entidade certificadora de uma dada forma de aplicar um dado conhecimento prático.

 

Em conformidade com isso, em nossa realidade contextual passam a existir duas figuras: “nós” e os outros. Nós, sem a humanidade que há nas pessoas, pois somos instrumentos de produção de soluções e os outros também sem essa humanidade, posto que são caracterizados como aplicadores das soluções que produzimos e que as teriam buscado como se fossem instrumentos de corte que buscam o esmeril a lhes afiar.

 

Esse pensamento, por simples que seja, está por trás das ações de todos os profissionais atuantes em todos os campos e, dessa forma, também está por trás do pensar e fazer dos bibliotecários brasileiros.

 

Uma forma pontual pela qual essa ideia se manifesta está presente nos artigos 5, 6 e 7 do Código do Ética do Conselho Federal de Biblioteconomia (Resolução CFB número 42, de 11 de janeiro de 2002). De modo elementar está evidente nas relações que o Código estabelece sobre a conduta que o Bibliotecário deve ter perante seus colegas de profissão (art. 5); a conduta que o Bibliotecário deve ter perante a “classe” (art. 6) e a conduta que o Bibliotecário deve ter perante os usuários ou clientes (art. 7). No caso do artigo 5, a conduta está disposta em oito prescrições; no caso do artigo 6, a conduta está disposta em sete prescrições e no caso do artigo 7, a conduta está disposta em três prescrições. Trocando em miúdos, há quinze prescrições a serem seguidas pelos bibliotecários, quando olham as relações que devem ter entre si e apenas três prescrições quando se trata das relações que terão com os usuários. Daria para se dizer que os usuários são desconhecidos dos bibliotecários? Que os bibliotecários não fazem a menor ideia de quem são os usuários ou clientes? Ou, de outro lado, que os bibliotecários sabem tanto quem são entre si, que devem claramente estipular a forma com que cada um deve conduzir-se no Grupo? Nesse caso, esse saber tão bem permite antecipar a maioria das situações em que os bibliotecários, como indivíduos que são, têm algum potencial de não sociabilidade que deve claramente ser antecipado, dando base para a  afirmação de como devem agir no trato com seus pares?

 

Esta reflexão, evidentemente, vem na sequência daquela apresentada na coluna do mês de julho. Simplesmente, há muitas questões a serem examinadas pelos bibliotecários, e parte delas não serão resolvidas com projetos mobilizadores em prol de determinados tipos de bibliotecas; a maioria das questões em aberto perpassa a necessidade de se conhecer o contexto em que estamos situados e saber sobre as carências das pessoas que demandam conteúdos informacionais cujo acesso pode ser facilitado pelo trabalho de bibliotecários. Só com esse conhecimento se poderá assumir com mais segurança que relação os bibliotecários podem querer ter com a sociedade. Só com esse conhecimento se poderá ter base para fazer evoluir a um ponto além do que hoje está exposto no Código do CFB. Um Código de conduta, que redigido originalmente do final dos anos 1950 para o início dos anos 1960, pouco evoluiu em seus termos, sendo incapaz por isso de propor uma relação dos bibliotecários brasileiros com seus públicos, cuja evolução comportamental, econômica e política que ocorreu nos últimos cinquenta anos não está nele incluída.

 

 A título de esclarecimento do leitor, eis a transcrição dos artigos referidos.

 

Art.5º - O Bibliotecário deve, em relação aos colegas, observar as seguintes normas de conduta:

a) ser leal e solidário, sem conivência com erros que venham a infringir a ética e as disposições legais que regem o exercício da profissão;


b) evitar críticas e/ou denúncias contra outro profissional, sem dispor de elementos comprobatórios;

c) respeitar as idéias de seus colegas, os trabalhos e as soluções, jamais usando-os como de sua própria autoria;

d) evitar comentários desabonadores sobre a  atuação profissional;

e) evitar a aceitação de encargo profissional em substituição a colega que dele tenha desistido para preservar a dignidade ou os interesses da profissão ou da classe, desde que permaneçam as mesmas condições que ditaram  referido procedimento;

f) colaborar com os cursos de formação profissional, orientando e instruindo os futuros profissionais;

g) tratar com urbanidade e respeito os colegas representantes dos órgãos de classe quando no exercício de suas funções, fornecendo informações e facilitando o seu desempenho;

h) evitar, no exercício de posição hierárquica, denegrir a imagem de profissionais subordinados e outros colegas de profissão.

Art. 6º - O Bibliotecário deve, com relação à classe, observar as seguintes normas:

a) prestigiar as entidades de Classe, contribuindo, sempre que solicitado, para o sucesso de suas iniciativas em proveito da coletividade, admitindo-se a justa recusa;

b) zelar pelo prestígio da Classe, pela dignidade profissional e pelo aperfeiçoamento de suas instituições;

c) facilitar o desempenho dos representantes do órgão fiscalizador, quando no exercício de suas respectivas funções;

d) acatar a legislação profissional vigente;

e) apoiar as iniciativas e os movimentos legítimos de defesa dos interesses da classe, participando efetivamente de seus órgãos representativos, quando solicitado ou eleito;

f) representar, quando indicado, as entidades de Classe;

g)  auxiliar a fiscalização do exercício profissional e zelar pelo cumprimento deste Código de Ética comunicando, com discrição, aos órgãos competentes, as infrações de que tiver ciência.

Art.7º - O Bibliotecário deve, em relação aos usuários e clientes, observar as seguintes condutas:

a) aplicar todo zelo e recursos ao seu alcance no atendimento ao público, não se recusando a prestar assistência profissional, salvo por relevante motivo;

b) tratar os usuários e clientes com respeito e urbanidade;

c) orientar a técnica da pesquisa e a  normalização do trabalho intelectual de acordo com suas competências.


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FRANCISCO DAS CHAGAS DE SOUZA

Docente nos Cursos: de Graduação em Biblioteconomia; Arquivologia; Mestrado e Doutorado em Ciência da Informação da UFSC; Coordenador do Grupo de Pesquisa: Informação, Tecnologia e Sociedade e do NIPEEB