PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA


  • A prática profissional e a ética voltadas para a área da Ciência da Informação.

PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA: VAMOS ABOLIR O CÓDIGO DE ÉTICA DO BIBLIOTECÁRIO BRASILEIRO?

A linguagem do Código de Ética do Bibliotecário brasileiro expressa uma postura deontológica dessa categoria profissional. Através deste instrumento e com essa postura o bibliotecário diz o que fará, como obrigação, para o bem da sociedade. Entre essa vontade presumida e a realidade vivida no dia-a-dia há uma distância enorme que se manifesta pela expectativa de uma clientela, que não está subordinada ao que pensa ou quer o bibliotecário.

 

Como pessoas, as que portam a profissão de bibliotecário e as que constituem o seu público, carregam valores próprios, às vezes muito distintos entre si. Tendo em vista os seus condicionamentos históricos, notadamente de caráter material, cada um desses grupos acredita, proporcionalmente às suas esperanças, nos compromissos afirmados pelo outro lado. Em vários momentos, os discursos tendem a se tornar antagônicos, sobretudo quando pesa a avaliação da relação de custo x benefício entre o gasto social e o retorno prestado pelos serviços executados por pessoas bibliotecários ou serviços realizados por outros grupos ocupacionais, dos quais as pessoas portadoras do papel de bibliotecário são as usuárias. Ambas as partes, pessoas bibliotecárias e pessoas que exercem outras profissões, conduzem-se através da mesma postura ética que, na sociedade mais ampla, hoje é predominantemente utilitarista. Nessa circunstância a pessoa que carrega o papel de bibliotecário, manifesta-se fora desse seu papel social e, para além de todo compromisso deontológico, reivindica e quer ver aceitos a obtenção de maior salário, menor jornada de trabalho, mais tempo de dias feriados ao longo do ano, mais benefícios trabalhistas, etc. e, em sentido oposto, o público em geral requer menores taxas de impostos, menores desembolsos com pedágios nas estradas, menor custo da cesta básica alimentar, educacional, bibliográfica, etc.

 

Essa condição que torna homogênea a percepção e o desejo de todas as pessoas, quanto aos benefícios sociais e os do trabalho, estão obscuras nos tais Códigos de Ética das profissões. Tal fato, deveria suscitar, ao menos, um debate mais amplo com o envolvimento de toda a sociedade, acerca do que significa ou do peso que pode ser atribuído a tais instrumentos.

 

Se for considerado que esses Códigos estão situados num dado tempo e espaço em que foram concebidos, pode-se concluir que não dão conta de responder à própria transformação dos valores e desejos de todos os membros da sociedade, que, em última instância, têm nesses documentos, somente um meio para regular a discussão nesse dado espaço e tempo, com vida futura relativamente breve. Se os Códigos de Ética são não mais que instrumentos de regulação de um discurso associado a uma conduta profissional, eles meramente objetivam facilitar a produção de um consenso situado e, por isso, não pensam e nem agem. Por isso mesmo, a eles, per si, não é cabível atribuir o que deve ser atribuído a quem o escreveu, aprovou e sancionou. Se quem o escreveu, sancionou e o sustenta afirma da necessidade de uma conduta do dever, com base no imperativo categórico Kantiano, destinado a assumir a responsabilidade em promover o melhor resultado do seu trabalho para o público, como pode esse grupo profissional em seu cotidiano se portar, sem crise de valor ético, como consumidor de serviços, buscando, utilitariamente, o máximo retorno para as taxas, impostos e demais investimentos que realiza? É esse o dilema que o profissional bibliotecário brasileiro vive hoje. É isso também, que requer uma re-escritura ou a abolição do Código de Ética do Bibliotecário brasileiro nos termos em que está redigido.


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FRANCISCO DAS CHAGAS DE SOUZA

Docente nos Cursos: de Graduação em Biblioteconomia; Arquivologia; Mestrado e Doutorado em Ciência da Informação da UFSC; Coordenador do Grupo de Pesquisa: Informação, Tecnologia e Sociedade e do NIPEEB