SALA DE AULA: DIA A DIA NA UNIVERSIDADE


  • A coluna propõe reflexões sobre o dia a dia na universidade e na sala de aula, desafios do início na carreira docente etc. A inspiração advém de conversas com colegas e algumas leituras, sobretudo, das obras "Pedagogia da Autonomia" e "Pedagogia do Oprimido" de Paulo Freire e "Conversas com um jovem professor" de Leandro Karnal.

UM ANO DE ENSINO REMOTO EM VIRTUDE DA COVID-19: APRENDIZADOS E DESAFIOS

Há pouco mais de um ano, no dia 26 de fevereiro de 2021, completamos um ano do primeiro caso de coronavírus no Brasil. As atividades de ensino remoto em caráter emergencial, por sua vez, tiveram início, em sua maioria, em meados de abril, quando houve a suspensão das atividades presenciais nas escolas e universidades públicas e privadas.

Nesse período, nos ambientes virtuais de aprendizagem, as frases mais frequentes foram:

“Vocês estão me ouvindo?” ou “Vocês estão me vendo”?

“Seu microfone está fechado!” ou “Fulano, fecha seu microfone!”

“Acho que travou aqui...” ou “Ixe, você está travado!”

“Desculpe pessoal, caí aqui...” ou “Minha internet caiu!”

“Os slides estão aparecendo?” ou “Professor, você parou o compartilhamento!”

Além dessas e outras frases, lidamos também com interferências externas incapazes de serem evitadas, como: o latido do cachorro; o choro do bebê; o som da televisão ou do rádio; a conversa paralela dos moradores; o barulho de veículos, motocicletas, aviões etc. Com o passar do tempo, dentro do possível, tais ruídos foram “normalizados” e passaram a ser “aceitos”, por exemplo, houve casos em que os pets e os filhos também queriam aparecer na chamada de vídeo.

Há que se destacar o árduo esforço dos protagonistas desse processo de ensino-aprendizagem que era caráter emergencial, mas que dura mais de um ano e se encaminha para mais um.

De um lado, temos os professores que adaptaram não só o espaço físico de suas residências, como reformularam a rotina pessoal, familiar e doméstica e (re)planejaram suas disciplinas, atividades e avaliações. Muitos tiveram que adquirir dispositivos com recursos próprios que viabilizassem um ensino de qualidade.

De outro, temos os estudantes que, em sua maioria, tiveram e ainda têm que assistir as aulas e realizar atividades e avaliações a partir de seus dispositivos móveis, compartilhar equipamentos e ambientes com demais membros da residência, não participam das aulas síncronas pela falta de ferramentas necessárias (microfone e/ou câmera, por exemplo), adaptar-se ao ensino remoto tendo em vista que se matricularam em cursos presenciais. Muitos tiveram sua rotina de trabalho afetada ou mesmo ficaram desempregados, o que interfere negativamente na disponibilidade para frequentar as aulas síncronas e na realização das atividades.

Como professor, posso dizer que uma das maiores queixas em relação ao ensino remoto deve-se a baixa interlocução com os estudantes. Ainda que os ambientes virtuais de aprendizagem e as plataformas para realização das aulas síncronas permitam a interação instantânea, poucos são os estudantes que se manifestam a partir do chat ou da oralidade. Em menor ocorrência ainda, incidem os estudantes que permanecem com suas câmeras abertas (muitos são os motivos que levam a não abertura das câmeras, tenho noção disso e não discuto aqui essa questão). Ministrar aulas e visualizar as iniciais dos estudantes ou suas fotos, fez e ainda faz com que o processo se torne ainda mais “distante” e “frio”, oposto ao que se está acostumado nas aulas presenciais. Assim, torna-se impossível depreender as reações, feições e manifestações corporais e as expressões dos estudantes em relação a aula.

A partir dos relatos de muitos estudantes, posso dizer que a maior queixa se deve a dificuldade em se concentrar tanto nas aulas síncronas quanto assíncronas e do acúmulo de atividades a serem entregues periodicamente. Muitos também apontam a carga excessiva de leituras extensas que precisam ser realizadas.

Quanto ao aprendizado e aos desafios por parte dos docentes, destaco a sensibilização e a compreensão das distintas realidades estudantis, o experimento e uso de diferentes plataformas e ambientes virtuais de aprendizagem, a capacidade de síntese e delimitação dos conteúdos a serem ministrados e a busca constante por um ensino dinâmico, inovador, participativo, crítico e reflexivo.

Para os estudantes, acredito que os desafios e as possibilidades de aprendizado consistem na constante busca por um aprendizado cada vez mais autônomo, no esforço diário de se concentrar em casa em meio à tantas distrações e dificuldades, entre outros.

Por fim, tenho a certeza de que nesse um ano de pandemia professores e estudantes fizeram o possível e o impossível para a manutenção do padrão de qualidade da educação (alguns com mais ou menos dificuldade).

Ensinar e apreender durante uma pandemia – período em que o negacionismo científico, fake news e desinformação se fazem tão presentes – é sim um desafio, mas, sobretudo, um ato de coragem e resistência daqueles que acreditam no potencial transformador da educação e no papel da ciência para a sociedade.


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JOÃO ARLINDO DOS SANTOS NETO

Professor Colaborador do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina (UEL) desde 2013. Doutor e Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista e Bacharel em Biblioteconomia pela UEL.