O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO (2)
A linguagem, portanto, é fundamental para a construção do conhecimento, uma vez que "o significado de uma palavra representa um amálgama tão estreito do pensamento e da linguagem, que fica difícil dizer se se trata de um fenômeno da fala ou de um fenômeno do pensamento" (2).Pense - que tipo de memória você teria sem palavras? E se precisasse se lembrar que bananas, digamos, eram comida boa? Não dá para armazenar a fruta real na cabeça para referência posterior e, portanto, uma impressão sensorial seria alojada: o formato e cor, a sensação lisa de sua casca e o cheiro doce da polpa. Na próxima vez que se deparasse com um objeto longo, liso e amarelo com um cheiro parecido com o de banana, você faria uma correspondência dessas memórias sensoriais com o seu valor e saberia que é bom.
Até aqui, tudo bem; é dessa forma (bem grosseiramente) que as memórias são guardadas, com ou sem linguagem, e funciona bem até onde se sabe. Mas e se você quisesse estimular a si próprio com a idéia de uma banana? Como levaria essas memórias sensoriais à consciência? Sem algum símbolo, como um nome, para um objeto, você não tem nada com que pescar do armazenamento as memórias dele. Elas podem ser trazidas à mente por lembretes sensoriais - um clarão de amarelo, talvez -, mas o acesso voluntário a elas, por solicitação será muito mais difícil. No entanto, uma vez que você possa rotular as coisas, poderá colocar sua mente em um arquivo e enchê-lo de representações do mundo exterior. Você poderá então apanhar as representações quando as desejar, manipular e justapor, criando novas idéias no processo. Isso cria um modelo dentro do qual as idéias podem ser ordenadas e estruturadas, dando formato e estabilidade às noções que, de outra forma, permaneceriam nebulosas (1).
A construção do conhecimento é entendida como um processo dinâmico, sem fim, do qual a linguagem faz parte. É a linguagem que consolida, de fato, o novo conhecimento. "O pensamento não é simplesmente expresso em palavras; é por meio delas que ele passa a existir" (2).
A cada conexão estabelecida pelo cérebro humano, a partir das diferentes leituras das experiências vivenciadas pelo indivíduo, o conhecimento é construído e, portanto, é cumulativo. "As idéias são criadas nos lobos frontais; os planos, construídos; os pensamentos, juntados às suas associações para formar novas memórias" (1).
As associações são feitas individualmente, por isso mesmo, o conhecimento construído é individual e único. Como exemplo, pode-se citar que dois indivíduos, nascidos na mesma família, com a mesma educação, o mesmo meio social e econômico, a mesma trajetória de vida, com experiências vivenciadas conjuntamente, não produzirão o mesmo conhecimento. De certa forma, isso é muito reconfortante, porque nos diferencia enquanto indivíduos.
O conhecimento, portanto, é único. Nesse sentido, as organizações criam mecanismos, como a gestão do conhecimento, para buscar compartilhar o conhecimento gerado por cada pessoa, de forma a possibilitar maior socialização e integração entre elas, visando obviamente resultados positivos para o negócio da organização.
Alguns acreditam que isso é extorquir o bem mais valioso dos indivíduos, a inteligência. No entanto, uma cultura voltada para o compartilhamento e socialização do conhecimento, beneficia a todos, uma vez que a troca possibilita também o acesso ao conhecimento gerado por outros indivíduos. Nesse caso, todos ganham. Se analisarmos que a ciência é construída dessa forma, qual seja, o acesso ao conhecimento gerado por diferentes indivíduos, e que somente por esse motivo, foi possível a humanidade avançar tanto, podemos entender o quanto isso representa para uma organização.
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1 CARTER, R. O livro de ouro da mente: o funcionamento e os mistérios do cérebro humano. Rio de Janeiro: Ediouro, 2003. 431p.
2 VIGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem.
2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. 194p.