PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA


  • A prática profissional e a ética voltadas para a área da Ciência da Informação.

PRÁTICA PROFISSIONAL E ÉTICA: ABORDAGEM DA ÉTICA NA FORMAÇÃO DE BIBLIOTECÁRIOS NO BRASIL

Há um fato, mais corriqueiro do que pode parecer, que se manifesta no distanciamento que se percebe do tratamento dado à temática (no ambiente de formação acadêmica do bacharel em biblioteconomia no Brasil) substantivamente motivadora da manutenção desta coluna aqui no Infohome. Dito de outro modo, há limitada inserção do tema ética e/ou ética profissional nos projetos pedagógicos dos Cursos de Biblioteconomia, embora a preocupação esteja presente na categoria bibliotecária brasileira, desde os anos finais da década concluída com o ano de 1960.

 

A revelação sobre isso, sobre esse significativamente forte desinteresse no tratamento curricular da temática em torno da ética e ética profissional, constitui o conteúdo de texto escrito pelas professoras Aldinar Martins Bottentuit, Maria Odaisa Espinheiro de Oliveira e Mary Ferreira. Referido texto, com o título Abordagens da ética nos cursos de Biblioteconomia e campos afins das instituições de ensino superior brasileiras, está inserido no livro que resultou de esforço da Comissão de Ética Profissional do Conselho Federal de Biblioteconomia, publicado no início deste ano de 2009.  

 

Organizado por Henriette Ferreira Gomes, Aldinar Martins Bottentuit e Maria Odaisa Espinheiro de Oliveira e intitulado A ética na sociedade, na área de informação e da atuação profissional: o olhar da Filosofia, da Sociologia, da Ciência da Informação e da Formação e do Exercício Profissional do Bibliotecário no Brasil, o volume com 187 páginas, constitui talvez uma das mais importantes contribuições que essa Comissão poderia por à disposição da comunidade bibliotecária do país. Entretanto, cabe destacar dentre os oito textos enfeixados na obra, de múltipla autoria, o título acima referido, que se encontra nas páginas  162 a 187. Qual a sua relevância?

 

O texto resultou de uma pesquisa junto aos cursos do campo da Biblioteconomia e afins. Assim, atingiu a um total de 37 instituições de ensino, onde se desenvolvem tais currículos, sendo a maioria constituída por instituições vinculadas ao setor público. Em  34 destas Instituições, os cursos têm a designação Curso de Biblioteconomia, dos quais pouco contam com algum acréscimo (do tipo Biblioteconomia e Documentação, Biblioteconomia e Ciência da Informação). Do total de 37 cursos, pois cada Instituição identificada mantém um Curso, dois encontram-se na região Norte; quatro na região Centro Oeste; oito na região Nordeste; sete na região Sul e dezesseis na região Sudeste.

 

As autoras identificaram a modalidade em que os conteúdos da temática ética são inseridos e apresentados nesses Cursos. Sua constatação é de que há três modalidades: a) como disciplina própria; b) como parte ou unidade dentro de outra disciplina e c) como conteúdo transversal, isto é, sem uma inserção disciplinar específica. Como disciplina própria, essa temática está inserida no projeto pedagógico de  nove cursos, sendo que em sete tem caráter obrigatório, em um curso o caráter é  eletivo e em outro o caráter é optativo. Na maioria, isto é, em cinco cursos, a carga horária está na faixa das 30 horas, em dois na faixa das 60 horas, em um na faixa das 70 horas. No último, a carga está na faixa das 80 horas.

 

As autoras afirmam: “Se considerarmos que o universo da pesquisa atingiu 37 cursos [constata-se] que 75% deles não têm apresentado uma dimensão mais ampla à  discussão de Ética, haja vista que nesses cursos os conteúdos de Ética ou Ética Profissional estão inseridos em disciplinas como Fundamentos de Biblioteconomia, Introdução à Biblioteconomia e Ciência da Informação, entre outras” (p. 182)

 

Ora, esses são os dados e deles se produz a análise cuja síntese confirma desinteresse, despreocupação, desconhecimento, distância que a Educação em Biblioteconomia no Brasil tem para com a realidade das pessoas concretas, como o “outro” do Filósofo Emmanuel Levinas, ou o “outro” de Umberto Eco (de “Quando o outro entra em cena nasce a ética”).

 

Trata-se de uma distância, por pragmatismo ou por ignorância, que revela, já no ensino de bacharelado em Biblioteconomia no Brasil, que o bibliotecário continuará a ser majoritariamente um profissional das técnicas para elas mesmas, da gestão para ela mesma, das TIC para elas mesmas.

 

Todo o discurso que se acentuou nos últimos anos, enviesado pelo apelo superficial do Moderno Profissional da Informação dos anos da década encerrada com o ano 2000, simplesmente mais agravou o deslocamento das questões éticas no âmbito das práticas profissionais bibliotecárias brasileiras.

 

De outro lado, esse texto acima comentado, pode estar a apontar que o estiramento dessa corda já foi ao seu ponto máximo. É preciso que se realize profundas reflexões sobre a responsabilidade social e moral do ensino de bacharelado em Biblioteconomia neste país. As instituições onde são ministrados os Cursos de bacharelado em Biblioteconomia, assim como os seus dirigentes, docentes, discentes, mais do que em qualquer outra época – principalmente em face da fragmentação e da celeridade que marca o momento atual – necessitam discutir o futuro que o Brasil, no âmbito das práticas bibliotecárias, pode ter, deve ter, deve querer ter.

 

Cabe a eles, mas também cabe a toda a categoria bibliotecária, especialmente, pela mobilização de suas Associações, de seus pesquisadores, da Federação de Associações e das Associações de Ensino e de Pesquisa, enfrentar urgentemente essa questão.


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FRANCISCO DAS CHAGAS DE SOUZA

Docente nos Cursos: de Graduação em Biblioteconomia; Arquivologia; Mestrado e Doutorado em Ciência da Informação da UFSC; Coordenador do Grupo de Pesquisa: Informação, Tecnologia e Sociedade e do NIPEEB