LEITURAS E LEITORES


SELEÇÃO DE LIVROS INFANTIS PARA A BIBLIOTECA DA ESCOLA

Pais e educadores, cada vez mais, estão preocupados com a leitura da criança, no entanto, nem sempre têm clareza de que "tipo" de livro que deve sugerir a esse leitor em formação.

Se cabe indulgência à família quando escolhe inadequadamente um livro para a criança, com a escola a situação já é diferente, pois subentende-se que os professores tenham conceitos básicos formados a respeito do assunto e, portanto, têm critérios definidos para a seleção de livros. Ainda estamos inciando o caminho para que isso aconteça nas escolas, principalmente, as de educação infantil e de ensino fundamental.

Nesse contexto de escolha de livros, existem duas situações distintas. A primeira é aquela em que se indica livro para uma criança em especial; a outra, é aquela em que seleciona um acervo para compor a biblioteca da escola. Na verdade, uma é continuidade da outra, mas aqui nos fixaremos na segunda situação.

A escolha de um acervo para compor a biblioteca escolar, antes de mais nada, está no âmbito pedagógico, ou seja, da compreensão pedagógica que a escola envolvida tem da leitura, da sua resposta ao porquê daquele acervo. Se os princípios estão claros, praticamente os critérios para a seleção estarão postos. Mas o que se vê, geralmente, é a compra (quando ela existe) de forma aleatória.

A partir do momento que a equipe pedagógica da escola estabelece critérios, o que está subjacente nesse processo é a concepção de leitura que permeia o planejamento pedagógico da mesma. Aí se completa um ciclo contínuo de se pensar, de se planejar a leitura e a formação de leitores na escola.

Mas que outros aspectos podem ser considerados para a seleção de livros para a criança? Um dos aspectos é conhecer quais são as características do desenvolvimento intelectual da criança de cada fase. Entender como a criança se desenvolve é um requisito que auxilia na seleção dos livros. Não se pode, com isso, estabelecer divisão muito rígida, pois há leitores precoces.

A diversidade editorial é outro aspecto fundamental no processo de seleção do acervo. É muito comum as escolas adquirirem livros de uma única casa editorial, mas oferecer variedade editorial amplia a maneira de ver um assunto, de discernir qualidade editorial, de texto e ilustração e tudo isso enriquece a formação do leitor.

Outro cuidado que se deve ter, talvez seja um dos mais importantes, refere-se ao texto do livro. Há muito livro infantil com erros ortográficos e de concordância verbal e nominal. Além de um estilo canhestro de escrita, cheio de diminutivos, principalmente os terminados em INHO, como se a criança se interessasse apenas por "coisas" pequenas. Na verdade, a criança busca o contrário, ela se mira no adulto, quer copiá-lo, pois é uma das formas dela aprender. Portanto, leituras, como as anteriormente citadas, não contribuem para sua maturidade emocional.

O enredo da história também deve ser analisado, pois muitos deles mantêm uma estrutura narrativa lenta, chata, sem surpresa e, principalmente, querem, a todo custo, passar lição moral para a criança. A história bem escrita ensina sem que se pareça uma receita de boas maneiras. Há livros em que a personagem, geralmente uma criança, faz tudo certinho: obedece rigorosamente aos pais (coitada da Chapeuzinho...), não se suja, nem diz palavras feias, etc. Cria um mundo artificial, sem a contradição da emoção humana.

Também não estamos apregoando que se incentive as crianças à má educação, ao desrespeito aos pais etc., mas sim dizer que o alguém tão certinho assim não se parece humano e, portanto, uma narrativa com esse padrão não faz muito sentido para a criança, contribui pouco para seu amadurecimento emocional, uma vez que não apresenta conflitos verdadeiramente humanos, que a ajudam a confrontar-se consigo mesma e com os outros.

Aliada ao texto está a ilustração. Embora vivamos num mundo que utiliza maciçamente a imagem, a escola parece viver na pré-história da imagem, devido à sua pouca intimidade com essa linguagem. O que decorre disso é que fatalmente a escola tem dificuldade para avaliar este quesito nos livros infantis. A ilustração estimula a imaginação da criança ou simplesmente reproduz o que diz o texto? Há coerência entre o que o texto diz e o que a ilustração apresenta? Por exemplo, há livros que falam que a personagem estava com uma rosa na mão, mas na imagem a representação é de um cravo; ou apresenta numa paisagem de rio (água doce), uma mistura com elementos marinhos. Parecem insignificâncias para adultos, mas que podem formar conceitos errôneos na criança.

Muitos são os aspectos que podem ser discutidos para formar o acervo da biblioteca da escola, mas para tanto é necessário que a escola saiba o que deseja da leitura para formar leitores. Além disso, selecionar acervo para crianças pressupõe, acima de tudo, que aquele que fará a seleção seja leitor, tenha intimidade com os livros.


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ROVILSON JOSÉ DA SILVA

Doutor em Educação/ Mestre em Literatura e Ensino/ Professor do Departamento de Educação da UEL – PR / Vencedor do Prêmio VivaLeitura 2008, com o projeto Bibliotecas Escolares: Palavras Andantes.