ORGANIZAÇÕES DO CONHECIMENTO


A CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO EM ORGANIZAÇÕES (1)



"A linguagem é tão necessária à constituição,
à perpetuação, ao desenvolvimento da cultura
quanto à inteligência, ao pensamento e
à consciência do homem; tão consubstancial
ao humano do humano que se pode dizer
que a linguagem faz o homem"
Edgar Morin

O processo de inteligência competitiva (I. C.) é aplicado em ambientes organizacionais, com o propósito de descobrir oportunidades e reduzir riscos, além de conhecer o ambiente interno e externo à organização, visando o estabelecimento de estratégias de ação a curto, médio e longo prazo. O processo de I.C. precisa alimentar-se de dados, informação e conhecimento constantemente.

O conhecimento humano é fundamental para o processo de I.C.. Nesse sentido, é importante conceituar o termo conhecimento: "informação valiosa da mente humana, que inclui reflexão, síntese e contexto, é de difícil estruturação, transferência e captura em máquinas, bem como é freqüentemente tácito"(1).

No processo de inteligência competitiva, a gestão do conhecimento é responsável pelo gerenciamento do conhecimento produzido na organização. Atua junto aos fluxos informais e tem como foco o capital intelectual ou capital humano da organização.

Construir conhecimento é uma atividade inerente ao ser humano. Todos os indivíduos, no âmbito organizacional, têm diferentes necessidades informacionais para desenvolverem suas atividades. Para compreender as necessidades informacionais que cada indivíduo possui, resgatamos os cinco anéis de Wurman(2):

"a) informação interna - são as mensagens que governam nossos sistemas internos e possibilitam o funcionamento do nosso corpo. Aqui, a informação toma a forma de mensagens cerebrais;
b) informação conversacional - são as trocas formais e informais, as conversas que mantemos com as pessoas à nossa volta, sejam amigos, parentes, colegas de trabalho, estranhos na fila de embarque ou clientes em reuniões de negócios. A conversa - talvez por sua natureza informal - constitui uma importante fonte de informação;
c) informação de referência - aqui nos voltamos para a informação que opera os sistemas do nosso mundo - ciência e tecnologia - e, mais imediatamente, para os materiais de referência que usamos em nossa vida. A informação de referência pode ser qualquer coisa, desde um manual de física quântica até a lista telefônica ou o dicionário;
d) informação noticiosa - ela abrange os ventos da atualidade - a informação transmitida pela mídia sobre pessoas, lugares e acontecimentos que talvez não afetem diretamente a nossa vida, mas podem influenciar nossa visão de mundo;
e) informação cultural - esta é a forma menos quantificável. Abrange história, filosofia e artes, qualquer expressão de uma tentativa de compreender e acompanhar nossa civilização. Informações colhidas nos outros anéis são incorporados aqui para construir o conjunto que determina nossas atitudes e crenças, bem como a natureza de nossa sociedade como um todo".

O indivíduo absorve informações visando atender as suas necessidades informacionais, que necessariamente precisam ser atendidas, sob pena de causar stress ou ansiedade informacional.

A construção de conhecimento exige do indivíduo algumas competências, como: saber pensar; saber observar; saber estabelecer relações; saber questionar; saber aproveitar o conhecimento acumulado através das experiências vivenciadas ao longo da vida; ter capacidade de apreender; ter consciência da própria ignorância. Além disso, precisa de condições cerebrais mínimas para exercitar as situações lógico-sistêmicas. A partir dessas competências o indivíduo tem condições de construir conhecimento, e a partir dessa construção, construir outro e mais outro... num movimento sem fim.

Pode-se afirmar que o processo mental é dialógico em todos os níveis, utiliza-se de funções, como por exemplo: associa/dissocia, isola/relaciona, analisa/sintetiza, problematiza/soluciona, diversifica/unifica, individualiza/coletiviza, percebe/representa etc. Essas funções são realizadas de forma complexa e utilizam estratégias cognitivas de modo a filtrar, compreender e criar conhecimento.

Morin, falando sobre o cérebro, sintetizou: "Eis uma máquina totalmente físico-química nas suas interações; totalmente biológica na sua organização; totalmente humana nas suas atividades pensantes e conscientes".

O cérebro humano, mais especificamente o encéfalo é constituído por dois hemisférios, o esquerdo e o direito que se complementam, mas ao mesmo tempo em que se complementam, se caracterizam de forma diferenciada e privilegiam diferentes funções:


É importante mencionar que a sociedade/cultura na qual o indivíduo está inserido é influenciadora no uso dos hemisférios. Na sociedade/cultura ocidental por exemplo, existe uma tendência em privilegiar o lado lógico, racional da criança. Essa condição sócio-cultural será determinante quanto a maneira que o indivíduo fará suas 'leituras' de mundo, bem como a forma que encaminhará suas ações(3).

O conhecimento recebe também, uma influência direta da linguagem (aqui entendida de forma lato), isto é, para criar conhecimento é necessário reconhecer o significado (signo) e a representação (símbolo) das coisas. A criação de conhecimento precisa necessariamente utilizar a linguagem, pois de outro modo ela se perderá na mente humana. Por isso, na gestão de conhecimento utiliza-se do jargão tácito/explícito, ou seja, sem o explícito não é possível acessar o conhecimento do outro, mas muitas vezes não é possível conhecer o próprio conhecimento.


"O espírito humano mora na linguagem,
vive de linguagem e
alimenta-se de representações".
Edgar Morin


Referências

1 DAVENPORT, T.; PRUSAK, L. Ecologia da informação: por que só a tecnologia não basta para o sucesso na era da informação. São Paulo: Futura, 1998. 316p.

2 MORIN, E. O método 3: o conhecimento do conhecimento. Porto Alegre: Sulina, 1999. 288p.

3 MATURANA, H. R; VARELA, F. J. A árvore do conhecimento: as bases da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena, 2001. 283p.


Obs.: No próximo mês continuaremos com a mesma temática.


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MARTA LIGIA POMIM VALENTIM

Professora Titular da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Pós-Doutorado pela Universidad de Salamanca (USAL), Espanha. Livre Docente em Informação, Conhecimento e Inteligência Organizacional pela Unesp. Docente de graduação e pós-graduação da Unesp, campus de Marília. Bolsista Produtividade em Pesquisa do CNPq. Líder do Grupo de Pesquisa "Informação, Conhecimento e Inteligência Organizacional". Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI) da Unesp, campus de Marília, gestão 2017-2021. Presidente da Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação (ABECIN), gestão 2016-2019.