ACESSO À LEITURA FOI DETONADOR DA GREVE DE FOME EM GUANTÂNAMO
A greve de fome que hoje envolve 92 dos 166 prisioneiros de Guantánamo teve como causa próxima o "tratamento indigno", por parte dos guardas, de exemplares do Corão que os prisioneiros conservavam nas suas celas. Um jornalista norte-americano quis saber que leitura lhes é oferecida como alternativa na biblioteca da prisão e chegou a conclusões surpreendentes.
O jornalista Charles Savage, que tem acompanhado nas colunas do New York Times a situação de Guantánamo, publicou também recentemente uma colecção de fotografias que mostram algumas prateleiras da biblioteca daquele campo de concentração.
Embora existam na biblioteca 3.500 livros, o critério que presidiu à sua escolha quase parece desenhado para afugentar os prisioneiros da biblioteca. Há, é certo, algumas obras que poderão interessar à maioria muçulmana da população prisional como a que leva o título "Fatâwas sur les pilliers de l'Islam" - mas logo essa existe em francês, que é um idioma desconhecido para a quase totalidade dos potenciais leitores.
Outros livros dispensam grande conhecimento de francês ou inglês, por serem bandas desenhadas. Mas os temas constituem verdadeiras provocações: um é o "Capitão América", outro as "Tartarugas Ninjas", outro ainda é "A Enciclopédia do Cão".
Livros como "Indiana Jones" também ajudarão, eventualmente, a escarnecer dos prisioneiros em nome de uma mentalidade colonial pós-moderna, ao passo que "Harry Potter", "Hobbit" e "O Senhor dos Anéis" terão um eco ambivalente.
Salvam-se uma obra de Garcia Márquez em árabe, algumas de Charles Dickens, a trilogia "Millenium" de Stieg Larsson e alguns livros de Pearl S. Buck em inglês, bem como um dicionário de Inglês-Pashtun.
Mas a impressão geral dos títulos fotografados é a de uma biblioteca mais apropriada para repelir do que para atrair os leitores naquele enclave do território cubano.
RTP Notícias - 29/04/13