CRÔNICAS E FICÇÃO


A CURVA DE UM MUNDO SEM CURVAS

Caminhei, quando pequeno, até o final da rua.

Meu pequeno mundo era restrito, tinha limites.

O mapa mundi, naquela época, era plano.

Sendo condescendente, um planalto.

Mas, com poucas curvas, menos ainda redondo.

A esquina era o fim.

Além dela nada havia. Apenas o precipício, o buraco,

o promontório, a queda, o vazio.

A curva era o limite de um mundo sem curvas.

O horizonte de minha vida chegava até o último

sobrado.

E foi assombrado que cheguei ao fim da rua.

Corajoso, embora minha coragem me levou ao medo.

O mundo existia depois dos meus olhos,

ultrapassava os domínios das luzes dos postes,

dos fios – que nunca soube de onde vinham.

Meu pai sumia na curva, mas sempre voltava.

Quem não voltou foi minha mãe:

a curva também não tinha volta.

E foi curvado que cheguei ao fim da rua.

O que vi pareceu o que já sabia.

A redundância.

A rua parecia reproduzida, imitada, reconstruída.

A cada rua, uma nova rua, a mesma.

E foi a esmo que cheguei no fim da rua.

Eu mesmo.

A coragem foi pouca. Olhei e voltei.

Ensimesmado, retornei. Para minha mãe.

A geografia era outra. O mapa com mais uma página.

E foi marcado que cheguei ao fim da rua.

Marcado pelo desconhecido, pela ânsia de conhecer.

Conhecer marcou minha vida, determinou minha sina.

A rua se perpetuou: depois da primeira esquina havia

outra.

Após ela, outra e outra e outra e outra.

Não sei quantas ainda até o fim da rua

ou da vida.

Autor: Oswaldo Francisco de Almeida Júnior

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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.