LITERATURA INFANTOJUVENIL


PODE OU NÃO IPOD?

Com a colaboração de Pedro Bortolin de Abreu Pestana

 

 

Nós vivemos rodeados de palavras, fico feliz por isso, pois adoro palavras, palavrinhas, palavrões (no sentido empregado pela personagem da Ana Maria Machado). E como não poderia ser diferente as palavras também gostam de andar soltas e na moda. Por isso quando alguém começa a falar uma palavra quase desconhecida um montão de gente começa a usar também. Por exemplo: “tipo assim”, cansou nossos ouvidos. Atualmente, os jovens têm adotado muitas palavras ligadas à objeto de consumo. Outro dia só se falava em pen drive, em Mp3, depois Mp4, agora nossos ouvidos estão captando o tempo todo iPod. iPod daqui, iPod dali.

 

Para quem não sabe iPod:

 

refere-se a uma série de players de áudio digital projetados e vendidos pela Apple Computer. Os aparelhos da família iPod oferecem uma interface simples para o usuário, centrada no uso de uma roda clicável, ou click wheel. A maioria dos modelos do iPod armazenam mídia em um disco rígido acoplado, enquanto os modelos menores, o iPod shuffle e o iPod Nano usam memória flash. Como a maioria dos players portáteis digitais, o iPod pode servir como um armazenador de dados quando conectado a um computador. (http://br.answers.yahoo.com/question/?qid=20060722201752AA655AW).

 

Desculpe-me, mas o meu instinto de bibliotecária e minha curiosidade enciclopedista não resistiram.

 

E foi pensando nesse tal de iPod que tive uma idéia brincante. Fico tão feliz quando tenho idéias brincantes, pois tenho me deixado contaminar pelo mau humor desse mundo estressado e cheio de gente carrancuda!

 

Outro dia, por exemplo, estava “incentivando” o meu sobrinho Pedro (agora com seis anos) a largar o jogo do computador para tomar banho (uma missão quase impossível) e ele me interrompe para contar uma piada que leu no livro que a tia Silvinha (a outra tia) comprou para ela. Isso mesmo, na nossa família as mulheres (professoras ou não) têm o vício saudável do auto-presenteamento com livros infantis.

 

E lá vai a história que ele contou e depois corrigiu se eu não escrevi errado:

 

Num cinema escuro estava passando um filme até que ouviram a voz de um menino falando para sua mãe.

- Mamãe.

- Fica quieto meu filho, vamos assistir o filme.

- Eu quero minha bolinha!

- Quando acender a luz a mamãe procura a sua bolinha.

- Mamãnheeeê, eu não estou achando minha bolinha!

Nisso as pessoas começam a falar:

- Tira esse menino do cinema!

- Procura logo essa bolinha desse chato!

As pessoas em volta dele começaram a procurar a bolinha, mas nada encontraram.

- Viu meu filho, não achamos a sua bolinha!

Ele então encolheu os ombros, colocou o dedo no nariz e disse:

 - Deixa que eu faço outra.

 

É óbvio que eu ri muito, e talvez se eu tivesse lido sozinha, não teria sido tão prazeroso quanto ouvir a narração feita por ele.

 

Mas voltando ao mundo carrancudo, a palavra iPod começou a soar engraçada nos meus ouvidos e comecei a brincar: podenãopodeihPod! – podenãopodeihPod! – podenãopodeihPod!

 

Resolvi então brincar também com meu assunto preferido – a mediação de leitura, usando a palavra iPod, para isso resgatei da minha coluna de setembro 2003 os 10 Direitos Imprescritíveis do Leitor estabelecidos pelo escritor Daniel Pennac no seu livro – Como um romance. E em seguida criei um personagem (apesar de não gostar de diminutivo) chamado iPodinho.

 

Esse personagem é muito curioso e muito envolvido com as coisas do ciberespaço. Começando pela cabeça dele que fica no mundo da lua ou em qualquer planeta virtual, menos na Terra.

 

iPodinho é filho único de um casal de bibliotecários de uma cidade pacata à beira mar. O pai dele é ligado em colecionar livros antigos e a mãe uma criativa construtora de sites voltados às crianças e aos jovens. iPodinho é o maior assessor de sua mãe, pois além de dar palpites no seu trabalho, conversa com muitos internautas da sua idade para avaliar o trabalho dela.

 

Não deixava, porém de descobrir na internet livros que faziam a alegria de seu pai. E assim também se denominava assessor dele.

 

Você deve estar curioso (a) para saber quantos anos iPodinho tem? Então vou contar para você que ele tem, assim como meu sobrinho Pedro, seis anos. Muito novo né? Mas a criançada de hoje já nasce com um teclado na mão.

 

E é nesse teclado que iPodinho faz suas campanhas. Candidato? Não. Ele fala com o Brasil inteiro e defende que - É PROIBIDO PROIBIR LEITURA.

 

Recebe muitos e-mails que responde prontamente. Ele me mostrou algumas perguntas que costuma receber, elas são mais ou menos assim. E as respostas são exatamente essas.

 

Tenho dez anos, posso ler um livro fino?

R: iPod.

 

Tenho sete anos gosto de livros grossos, estou enjoado de ler livros de criança posso ler?

R: iPod.

 

Na biblioteca quero levar quatro livros e não apenas dois, posso?

R: iPod e fala para as pessoas que trabalham na biblioteca que: É PROIBIDO PROIBIR LEITURA.

 

Ninguém quer que eu leia gibi sossegado, pode?

R: Não iPod atrapalhar a leitura de ninguém.

 

Quero ler mais de um livro ao mesmo tempo, pode?

R: iPod.

 

Se eu não quiser ler, pode?

R: iPod, mas quando descobrir que ler é uma delícia, não vai parar mais.

 

Posso pular algumas páginas?

R: iPod, mas eu não faço isso, pois tenho medo de perder um trecho da aventura.

 

Se quiser ler em voz alta posso?

R: iPod, desde que não acorde a casa inteira.

 

Quero ler em qualquer lugar. No banheiro, por exemplo, posso?

R: iPod, mas saia correndo quando na sua casa tiver apenas um banheiro e alguém estiver apertado.

 

Gostei tanto de um livro que quero reler, pode?

R: iPod e faça isso quantas vezes quiser, eu perdi a conta de quantas vezes li – Raul da ferrugem azul da Ana Maria Machado, e já era grande quando descobri esse livro.

 

Quero sugerir a um adulto a leitura de um livro, pode?

R: iPod e iDeve.

 

Só quero ler texto na internet, pode?

R: iPod, mas aposto que você não percebe e sai na rua lendo tudo.

 

E se eu não quero ler só palavras e quero ler foto, filme, música, pode?

R: iPod ler o que tiver vontade.

 

Se não tenho dinheiro, fico sem ler?

R: não iPod. Vá a uma biblioteca pública, empresta, troca com alguém ou vá a um sebo se na sua cidade tiver um. Prá quem não sabe o que é um sebo, é um lugar onde se vende livros usados, bem barato.

 

Quando um adulto pede para ler prá mim, pode falar não?

R: iPod (a Sueli me contou que o Pedro fez isso com ela outro dia).

 

E, se ao contrário, você pede para um adulto ler prá você e ele não quer. Pode?

R: iPod, mas que pena, né! É tão bom prá você e prá ele.

 

Minha mãe está grávida, posso ler para o meu irmão?

R: iPod e muitooooooo.

 

E se um adulto me pede para explicar um livro, um teatro e eu não estou com vontade, posso ficar calado?

R: iPod. Diga que você quer curtir o que leu e outro dia vocês conversam.

 

Bom, se na sua cabeça restou a dúvida, tipo assim, porque incluí a história que o Pedro me narrou? Liga não, nem tudo na vida tem coerência e ser incoerente talvez seja uma das brincadeiras mais saudáveis!

 

Sugestões de Leitura:

 

Observação: os dois primeiros livros têm edições mais atuais, é que eu coleciono livros infantis desde a década de 70 e os meus estão velhinhos.

 

MACHADO, Ana Maria. Palavras palavrinhas palavrões. Rio de Janeiro: Codecri, 1982.

 

______. Raul da ferrugem azul. 6.ed. Rio de Janeiro: Salamandra, 1979.

 

TADEU, Paulo. Proibido para maiores: as melhores piadas para crianças. 5.ed. São Paulo: Editora Matrix, 2007.


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SUELI BORTOLIN

Doutora e Mestre em Ciência da Informação pela UNESP/ Marília. Professora do Departamento de Ciências da Informação do CECA/UEL - Ex-Presidente e Ex-Secretária da ONG Mundoquelê.