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TECÁRIOS EVANGELISTAS: DIVULGANDO A BOA INFORMAÇÃO

As tecnologias da informação são ricas em recursos e peculiaridades, não restritas apenas às características de software ou de hardware. Uma série de atividades ou atribuições baseadas no seu desenvolvimento ou uso ganha denominações ou designações no mínimo curiosas. É o caso do termo “evangelista” ou “evangelista tecnológico” (technology evangelist).

 

Um dos contatos com o uso do termo ocorreu em maio de 2006, durante palestra, na Universidade de São Paulo, proferida por Vinton G. Cerf, considerado “pai da Internet”. Entre suas realizações está a criação dos protocolos TCP/IP, ferramentas essenciais para a construção da rede. Na apresentação sobre o palestrante, despertou curiosidade geral a atividade desempenhada pelo Sr. Cerf, além de vice-presidente do Google é, também, evangelista chefe de Internet. Nessa função, responde pela identificação de novas tecnologias e aplicativos na Internet, e em outras plataformas para a empresa.

 

Em empresas de tecnologia, como o Google há uma preocupação com a ambiência tecnológica, em especial a Internet, cada vez mais abrangente e, ainda assim, uma terra de futuro desconhecido, onde as especulações são constantemente destruídas pela velocidade avassaladora das próprias tecnologias. Nesse contexto, faz-se necessário a existência de pessoas “visionárias” que detectem os rumos dessa evolução tecnológica. Neste sentido, a nomenclatura adotada para a atribuição tem sido: evangelista.

 

Tradicionalmente, o termo está associado à terminologia religiosa. No dicionário é definido como o Sacerdote que recita o Evangelho na missa; como também é a aquele que preconiza uma doutrina. Na doutrina cristã, a figura do evangelista por vezes se confunde com a do apóstolo. Entretanto, a diferença entre ambos é que, o evangelista deve simplificar o Evangelho e convencer os homens à fé (os quais já tinham o conhecimento do Evangelho - Atos 8:40). Já o apóstolo ia a novos lugares onde o Evangelho ainda não fosse conhecido, semelhantemente aos missionários da atualidade. Porém, a evangelização não é uma atividade somente religiosa. Tanto não o é, que o termo acabou tirado do contexto religioso pela semelhança no recrutamento ou conversão de pessoas ao uso de determinados recursos, realizado por adeptos comprometidos com propagação da informação sobre os mesmos.

 

É no mundo corporativo ambientado nas tecnologias de informação que aparece a nova função: “evangelista corporativo” ou “evangelista de produto”, desenvolvendo o processo de difundir um conjunto de idéias, práticas, produtos etc. O “evangelista tecnológico” é alguém que desempenha o trabalho de promover as novas tecnologias. Sua função pode ser uma atividade oficial ou não oficial, em nome de uma organização, ou decorrente de uma ação pessoal. Ele divulga o uso de um produto especifico ou uma determinada tecnologia por meio de conversas, palestras, textos e demonstrações.

 

Um dos primeiros evangelistas, normalmente citados, é Guy Kawasaki (funcionário da Apple), em meados da década de 80. Conhecido, também, como “Apple evangelist”, e “Mac evangelist”. Tinha por atribuição convencer desenvolvedores de software de que a plataforma de sua empresa era a ideal. Com base na experiência escreveu o livro “Selling the Dream: how to promote your product, company, or ideas and make a difference using everyday evangelism" (New York, HarperCollins, 1992), no qual propaga o conceito. Alguns deles são: dedicação a uma causa; busca de pessoas dispostas a ouvi-lo; saber para que sua causa serve e oferecer demonstrações. A causa pode ser um novo sistema, linguagem, ferramenta, produto ou serviço, entre outros. Outro evangelista conhecido é Jeff Barr, por muito tempo exercendo a função de web service evangelist na Amazon.com.

 

Mas apesar de haver sites de empregos oferecendo vagas para evangelistas, em especial nos Estados Unidos, a definição da função continua nebulosa. Existem vários tipos de evangelistas, desde aqueles que são porta-vozes ou personalidades importantes dentro de organizações como Google, Apple, Microsoft e Amazon etc., até profissionais comuns que se esforçam em defender uma causa sem necessariamente estarem ligados a uma instituição.

 

A atividade de evangelista tecnológico parece algo que um profissional de marketing desenvolve: promoção, divulgação, propaganda. A aplicação do termo envolve conceito de marketing: “products evangelists”, e “marketing evangelists”. Entretanto, não está restrita só à tecnologia ou ao marketing, mas também, a qualquer tipo de produto ou cultura. Neste sentido, pode ser citado, como exemplo, os evangelistas anônimos e “não remunerados” do iPod produzido pela Apple (considerado um ícone cultural); da Herbalife; de times de futebol (e viva o Guarani de Campinas); das “Pamonhas de Piracicaba”; da profissão bibliotecária (Conselhos Federal e Regionais de Biblioteconomia).

 

O que motiva um evangelista é diferente da motivação de um comerciante (vendedor, fornecedor, publicitário). Para ele os lucros e os números econômicos são secundários; ele realiza o trabalho porque acredita que está divulgando algo bom, que vai melhorar a vida das pessoas. Outra diferença, é que o evangelista precisa ter uma base de conhecimento técnico maior do que alguém de vendas ou marketing. Aspecto essencial para conquistar a credibilidade de outras pessoas.

 

Outros aspectos, citados, para o desempenho da atividade de evangelista são:

 

  • Capacidade de desmistificar a complexidade de uma nova tecnologia, trazendo-a para a realidade;
  • Facilitar o acesso à tecnologia por meio de eventos, encontros e palestras; e
  • Estar disponível para esclarecer dúvidas a respeito da tecnologia e/ou dos produtos nela baseados.

Como características pessoais, citam-se:

 

  • Capacidade técnica pertinente;
  • Habilidades didáticas (treinamento por meio de palestras e tutoriais);
  • Boa comunicação e disposição para falar sobre a sua causa com o maior número de pessoas possível – adequando discurso às necessidades e interesses de cada ouvinte.

Esses aspectos indicam que o evangelista não é necessariamente uma função organizacional. É quase um modo de vida. O que também caracteriza os evangelistas é a paixão por uma causa, não o seu emprego. Por isso acabam sendo importantes para as empresas.

 

Se o evangelista é alguém que acredita plenamente no que faz, e orienta a outros a acreditarem também; um bibliotecário pode e deve ser “bibliotecário evangelista” (tecário evangelista) ao promover os produtos e serviços de conteúdo informacional, desenvolvidos ou empregados para benefício da comunidade.

 

Na realidade muitos profissionais cumprem este papel, ainda que sob outros nomes, ou sem designação alguma se não a de bibliotecário. Ademais, ao longo da história, bibliotecas residiram em mosteiros e a profissão foi um verdadeiro sacerdócio (sem ironia).

 

Podemos encontrar inúmeros casos de profissionais que atuam como “evangelista da informação”. Exemplos podem ser visualizados na: divulgação do uso de periódicos eletrônicos; produtos e ações em prol da disseminação da produção técnico-científica brasileira; programas de promoção do livro e da leitura; e de valorização das bibliotecas (públicas e escolares). 

 

Diferentemente do ambiente corporativo ou de tecnologia, os “tecários evangelistas” são na maioria, profissionais anônimos motivados pela crença que a boa informação transforma o ser humano, conduz à construção da sociedade pelo conhecimento.

 

Há profissionais que também exercitam o papel de evangelizador tecnológico ao divulgar a importância do software livre como ferramenta de construção do acesso livre à informação; no desenvolvimento de programas de capacitação no uso de bases de dados; ou na realização segura da pesquisa na Internet. Enfim, eles existem e estão por ai. Aliás, você conhece algum, em especial?

 

Porém, não se é “tecário evangelista” apenas por estar sentado diante de um computador, no trabalho. Tem que estar comunicando-se e conscientizando o público; conhecer sua área e atualizar-se continuamente; e acreditar no que realiza para transmitir confiança em quem recebe o resultado de seu trabalho.

 

 

Indicação de leituras

 

Brandão, Aline. “Levando a Palavra” em TI. Disponível em: http://www.timaster.com.br/revista/materias/main_materia.asp?codigo=1237 Acesso em: 30/05/2007.

 

Brayton, Colin. What is an Evangelist? Or, How to Change the World With Happy Talk

Disponível em: http://cbrayton.wordpress.com/2007/02/03/what-is-an-evangelist-or-how-to-change-the-world-with-happy-talk/   Acesso em: 05/04/2007.

 

Seixas, Fabio.  O que faz um evangelista? Disponível em: http://blog.fabioseixas.com.br/archives/2006/02/ Acesso em: 02/06/2007.

 

Taylor, Dave. What's a technology evangelist? Disponível em: http://www.askdavetaylor.com/whats_a_technology_evangelist.html Acesso em: 02/06/2007.

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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.