ENTRE CONEXÕES E PROCESSOS INFORMACIONAIS


COMBATE À DESINFORMAÇÃO PELAS BIBLIOTECAS NO CENÁRIO DA PANDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS

A biblioteca pode ser caracterizada como um centro de recursos e de aprendizagem, com a disponibilização de diversos tipos de materiais (impresso, eletrônico e virtuais) e oferecimento de variados serviços, que estarão em consonância com o tipo de biblioteca e a comunidade em que faz parte, visando a sanar as necessidades informacionais de seus usuários. Acrescenta-se que alguns produtos estão condicionados aos recursos destinados às bibliotecas.

Esses serviços compreendem ações de âmbito educacional, informacional e cultural, como, por exemplo, visita guiada, empréstimo entre bibliotecas, salas de leitura, apoio à normalização, empréstimo domiciliar, levantamento bibliográfico, empréstimo de equipamentos eletrônicos, treinamento de bases de dados, Rede Wireless, orientação na ficha catalográfica, hora do conto, clube de leitura, exposições artísticas e/ou de temáticas emergentes, café literário, serviço de referência, ações de competência em informação, entre outros.

É importante salientar que com a pandemia do novo coronavírus (COVID-19), as bibliotecas tiveram que se reinventar, isto é, criar novas abordagens no que diz respeito aos produtos, recursos e serviços fornecidos tradicionalmente, fazendo uso principalmente das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), com ênfase nas mídias sociais e até mesmo nos recursos analógicos.

Neste sentido, destacam-se os serviços relacionados à competência em informação, mais especificamente, aos processos de avaliação de informação e de notícias falsas e/ou distorcidas, visando o combate à desinformação no que diz respeito ao novo coronavírus. Enfatiza-se que estes serviços podem contribuir para as questões no âmbito sanitário no Brasil, observando-se a difusão massiva de informações falsas e/ou distorcidas a este respeito, que têm provocado grande impacto por meio da manipulação da opinião da população, culminando com a ampliação de casos de contaminação do vírus no país.

A avaliação do conteúdo da informação consiste em processos para identificar: autoridade e reputação, atualização da fonte, consistência, validade, fidedignidade, confiabilidade da fonte, singularidade, completeza, cobertura, links internos e externos atualizados, facilidade para explorar o site, facilidade de uso, layout da fonte e suporte ao usuário (TOMAÉL et al., 2001).

Quanto às notícias falsas, a International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA, 2018) elaborou um Infográfico para auxiliar a identificar notícias falsas denominado Como identificar notícias falsas, de forma objetiva recomenda que olhe a fonte, leia o material por completo, verifique o autor, comprove as fontes utilizadas para dar fundamento a história, averigue a data, diferencie o tipo de informação (sátira ou conteúdo informativo), identifique seus próprios valores e crenças para compreender se podem afetar o seu julgamento e consulte um especialista, como por exemplo, o bibliotecário ou experts no assunto.

Neste sentido, diversas ações podem ser realizadas pelas bibliotecas a partir de duas perspectivas: uma com informações de cunho científico acerca do vírus e outra com ações voltadas para a avaliação de informação e de notícias falsas, ocorrendo concomitantemente. As ações podem acontecer de diversas formas, a saber: oficinas instrutivas online com informações acerca da pandemia, lives e webinars de curta duração com especialista visando informar e tirar dúvidas, tutoriais online no site da biblioteca acerca do novo coronavírus e de avaliação de informações e de notícias, vídeos de curta duração com informações sobre a pandemia e referente à avaliação da informação, infográficos contendo informações a este respeito, divulgação das agências de checagem de informações, cursos por meio de plataformas de aprendizagem, uma seção do site institucional das bibliotecas destinada à avaliação de informação e a divulgação dessas ações por meio de mídias sociais, tais como o Facebook, Instagram e Twitter.

As oficinas instrutivas online podem conter cuidados relacionados ao cotidiano das pessoas para evitar a contaminação do novo coronavírus, abarcando informações acerca de máscaras (formas de uso, evitar tocar e tirar, novas recomendações da OMS etc.), cuidados para lidar com o manuseio de alimentos, cuidados ao sair de casa, cuidados em relação aos livros, entre outros. Infere-se que são informações de âmbito básico, que precisam continuar a ser repassadas, principalmente com as novas atualizações, que ocorrem de modo constante.

As lives e webinars com especialistas acerca do assunto visando a oferecer e divulgar informações sobre o vírus, bem como possibilitar tirar dúvidas. Essas lives podem alcançar um amplo número de pessoas, também se recomenda que tenham um período curto ou médio de duração, tendo em vista que há uma diversidade na oferta de lives e webinars para todos para os públicos e estilos.

O conteúdo dos tutoriais online acerca do vírus podem ser retirados de sites e/ou mídias sociais da Organização Pan-Americana da Saúde/ Organização Mundial da Saúde (1) (OPAS/OMS) e do Ministério da Saúde (2). No site do Ministério da Saúde existe um espaço destinado à Saúde sem Fake News (3), em que é disponibilizado um número de WhatsApp para envio de mensagens da população que, por sua vez, serão apuradas pelas áreas técnicas e respondidas oficialmente se são verdade ou mentira (há um regulamento). Também se conta com um campo de busca por palavras e período e uma área com as Fake News relacionados ao novo coronavírus. Também podem ser realizados tutoriais visando demonstrar como avaliar as informações para uso em trabalhos e/ou pesquisa acadêmicas, assim como para verificar notícias falsas e/ou distorcidas distribuídas em mídias sociais, divulgando-os em etapas.

A produção de vídeos de curta duração com informações instrutivas sobre a pandemia e a respeito dos processos avaliativos, com cerca de um a três minutos, é uma proposta interessante para disseminar informações e manter o contato com os usuários. Além do que podem ser repassadas para e por outras instituições com os devidos créditos.

Os infográficos podem ser elaborados e disponibilizados recorrentemente, pois misturam textos, recursos visuais interativos e designs diferenciados que, por vezes, possibilitam maior compreensão do conteúdo pelos indivíduos.

Indicar, caracterizar, explicar e divulgar as agências de fact-checking, que significa checagem de fatos, tendo como objetivo verificar a veracidade das informações e/ou fatos. No Brasil, há algumas agências que trabalham com a avaliação de notícias de diferentes formas, por exemplo, para chegar especificamente questões ligadas à política e para investigar informações deturpadas em diversas esferas, por exemplo: Agência Lupa (4), Aos Fatos (5), Comprova (6), Boatos.org (7), Fato ou Fake (8) e FakeCheck (9).

Essas agências possuem modos específicos de analisar as informações veiculadas na internet, sendo que os critérios utilizados para checagem podem ser encontrados em seu próprio site, assim como fazem uso de etiquetas específicas para divulgar o seu parecer ao leitor sobre a notícia verificada.

Oferecimento de cursos de curta duração sobre processos avaliativos de informações, fontes e notícias, fazendo uso das plataformas de aprendizagem virtual, como o Moodle, por exemplo, disponibilizado por várias instituições por ser um software livre, que pode servir como apoio aos processos de ensino-aprendizagem do universo informacional.

Os sites institucionais das bibliotecas podem conter uma seção específica voltada para avaliação da informação e de notícias, contendo todos os recursos mencionados anteriormente, separados por temáticas. Recomenda-se também que tenham exercícios para que os indivíduos possam testar os conhecimentos adquiridos. Neste sentido, os bibliotecários da Indiana University East (10) desenvolveram um site interativo, LibGuide, para auxiliar os usuários a identificar notícias falsas. Este guia fornecerá informações para possibilitar que o usuário identifique o que é uma notícia falsa, para fazer a checagem de fatos, disponibiliza exercícios e jogos para que possam exercitar as habilidades desenvolvidas, traz esclarecimentos sobre os impactos das notícias falsas, menciona as ações a serem realizadas para evitar tais informações tendenciosas, apresenta algumas agências de checagem de fatos, discorre sobre os Deepfakes e vídeos, entre outros.

Por fim, acredita-se que as bibliotecas possam utilizar diversas mídias sociais para realizar a divulgação dessas informações, porquanto são populares e bastante utilizadas entre grupos de variadas idades, como o Facebook, Instagram e Twitter, e até mesmo WhatsApp. Pode-se mencionar o exemplo da Fundação Biblioteca Nacional, que neste contexto de pandemia resolveu disponibilizar materiais ao público (jornais, revistas, fotografias, gravuras e documentos em geral) com informações sobre aspectos culturais, sociais, históricos e factuais. Observa-se que “[...] a instituição montou uma equipe para garimpar material de interesse e exibi-lo em textos e com linguagem informal postados em suas redes sociais” (ZANINI, 2020).

Para o desenvolvimento dessas ações é necessário contar com uma equipe para realizar o planejamento, elaborar as atividades, distribuir as tarefas e executar o plano. A divisão de serviços não sobrecarrega os profissionais envolvidos, ao contrário, une e motiva a equipe, porquanto propicia a sensação de uma participação mais ativa na vida dos indivíduos e na sociedade, contribuindo para que possam enfrentar esse momento complexo.

No que se refere às informações científicas sobre o novo coronavírus e os critérios de avaliação de informações e de notícias, sugere-se que sejam empregadas conjuntamente para dar sentido à construção do pensamento crítico e à criação de uma base de conhecimentos pelos indivíduos, distinguindo-se as informações falsas daquelas científicas.

Observa-se que uma grande problemática que o setor acadêmico enfrenta é na linguagem utilizada em suas pesquisas, impossibilitando, às vezes, a sua compreensão. Por isso, é necessário o uso de uma linguagem mais casual, visto que há necessidade de divulgação de informações atualizadas, precisas, objetivas e confiáveis. Considera-se que informações de cunho científico devem ser divulgadas, propiciando não somente o acesso, mas compreensão por toda população.

De modo geral, no contexto da pandemia do novo coronavírus ocorreram diversas ações promovidas pelas bibliotecas ao redor do mundo que, apesar das circunstâncias, propiciaram uma aproximação maior com seus usuários e o desenvolvimento de ações mais dinâmicas, principalmente fazendo uso da TIC (analógicas e digitais). Percebe-se a responsabilidade social da profissão e das bibliotecas sendo efetivadas neste contexto, permitindo que os usuários sejam de fato o centro das atividades propostas por este espaço.

 

REFERÊNCIAS

INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). How to spot fake news. 2018. Disponível em: https://www.ifla.org/publications/node/11174. Acesso em: 08 jun. 2020

TOMAÉL, M. I. et al. Avaliação das fontes de informação na internet: critérios de qualidade. Informação & Sociedade: Estudos, v. 11, n. 2, p. 13-35, 2001.

ZANINI, F. Biblioteca Nacional busca salvação na internet. Folha de São Paulo, São Paulo, 17 abr. 2020. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/04/biblioteca-nacional-busca-salvacao-na-internet-durante-periodo-de-quarentena.shtml. Acesso em: 30 maio 2020.

 

Notas:

(1) https://www.paho.org/bra/

(2) https://coronavirus.saude.gov.br/

(3) https://www.saude.gov.br/fakenews

(4) http://piaui.folha.uol.com.br/lupa/

(5) https://www.aosfatos.org/

(6) https://projetocomprova.com.br/

(7) https://www.boatos.org/

(8) https://g1.globo.com/fato-ou-fake/

(9)https://nilc-fakenews.herokuapp.com/about

(10) http://iue.libguides.com/fakenews/index


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MARTA LEANDRO DA MATA

Doutora em Ciência da Informação (2014), Mestre em Ciência da Informação (2009) e Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP/Campus de Marília), com período de doutorado sanduíche na Universidade Carlos III de Madrid (2013). É professora do Departamento de Biblioteconomia e do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).