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ISBD EM REVISÃO, LRM EM IMPLANTAÇÃO E CATALOGADOR(A) EM METAMORFOSE

A Descrição Bibliográfica Internacional Normalizada (ISBD), enquanto padrão internacional, serve à promoção do controle bibliográfico universal, além de disponibilizar, de forma aceitável, os dados bibliográficos essenciais de recursos publicados em diversos países. Contribui, ainda, para tornar possível o intercâmbio de registros provenientes de diferentes fontes bibliográficas existentes no mundo, de maneira a poderem fazer parte dos catálogos de qualquer biblioteca.

É, neste contexto, que se estrutura o principal objetivo do IFLA ISBD Review Group (ISBD RG), a comissão responsável pela atualização da Norma. E, que desde a publicação da edição consolidada, em 2011, segue uma contínua política de manutenção, estruturada em acordo com o Plano Estratégico da IFLA CATS (IFLA Cataloguing Section), que contempla as ações contínuas de revisão da ISBD; bem como, o desenvolvimento de abordagens, padrões, regras e listas adicionais para informações que forneçam acesso a dados bibliográficos e de autoridade.

Neste aspecto, foi estabelecido, em relação a ISBD, um plano de trabalho para a sua revisão, compreendido no período de 2018 a 2022. Destaque-se, que a ISBD é o único padrão aberto e de livre acesso, mantido pela IFLA, que instrui os elementos de dados a serem transcritos e registrados como base da descrição catalográficas de recursos. 

O estabelecimento da Norma, como padrão descritivo, corresponde ao objetivo da IFLA de fornecer padrões e ferramentas acessíveis para todos, incluindo as comunidades que necessitam regras de fácil aplicação para a descrição dos recursos bibliográficos. 

Além disso, emprega-se a prescrição de pontuações em uma sequência específica de aplicação nos registros, como um meio de identificar e exibir os dados tornando-os compreensíveis, independentemente do idioma utilizado na descrição.

A necessidade de se proceder à revisão da ISBD é reconhecida como necessária, pela comunidade das bibliotecas e órgãos especializados vinculados à IFLA (especialmente, CATS e ISBD Review Group). A revisão periódica, portanto, é parte da política da IFLA para todos os seus padrões, como forma de garantir a sua permanente atualização e adequação às necessidades das comunidades de informação.

Especificamente, sobre a ISBD, é esperado que o seu conteúdo seja ampliado, com a inclusão de uma maior diversidade dos recursos informacionais, em especial, os recursos não publicados. A preocupação com esta extensão da normativa foi manifestada, pelo ISBD Review Group, anteriormente, em 2012.

Na atualidade, torna-se importante alinhar a Norma com o modelo conceitual preconizado pela IFLA – Modelo de Referência Bibliotecária (LRM). Modelo esse que pretende ser uma representação melhorada de entidade-relacionamento; e desta forma, explicitando os princípios que regulam a estrutura lógica da informação bibliográfica, sem as presunções sobre a maneira que os dados podem ser armazenados em um sistema ou aplicação específica. O modelo estabelece sua funcionalidade a partir das tarefas dos usuários: encontrar, identificar, selecionar, obter e explorar.

Acrescente-se, ainda, que a atualização da ISBD deve agregar os princípios preconizados na Declaração dos Princípios Internacionais de Catalogação – PIC, de 2016, que atualiza a edição de 2009, ao considerar as novas categorias de usuários, relacionados agora com os princípios do acesso aberto; da interoperabilidade e acessibilidade aos dados; das ferramentas de descobertas; e com as mudanças comportamentais dos usuários. São, portanto, os princípios preconizados pelo PIC que regem a criação e o desenvolvimento dos códigos de catalogação; além de embasarem a tomada de decisão dos bibliotecários de catalogação nos processos catalográficos e na formulação das políticas relacionadas ao acesso e intercâmbio dos dados bibliográficos.

Desde 2017, como preparação para o programa de revisão, o ISBD RG, desenvolve o alinhamento do conjunto de elementos ISBD com o conjunto de elementos do LRM. Tomou como base de compatibilização a edição ISBD Consolidada de 2011. Um relatório de trabalho sob o título: Task Group for the Analysis of the Alignment and Impact of IFLA LRM on ISBD, pode ser lido sobre as iniciativas. Indica a intenção de se implementar o LRM na estrutura da ISBD, porém, mantendo a sua granularidade; isto é, transformando a ISBD em extensão do LRM.

Quanto aos procedimentos, planejados para a revisão, estes incluem as seguintes etapas:

  1. - Alinhar a ISBD com a entidade Manifestação, ou seja, alinhar os elementos ISBD com os atributos da entidade "Manifestação";
  2. - Analisar os elementos da edição ISBD Consolidada excluídas ou consideradas obrigatórias, se a informação estiver disponível ou for designada opcional. Neste sentido, na introdução da edição é salientada que a inclusão de um dado é considerada obrigatória nos casos em que ocorram certos elementos e, em outros, se for necessário para a identificação do recurso descrito pelo usuário do catálogo.

A expectativa é que, na conclusão das duas primeiras etapas, a revisão resultante do conteúdo da ISBD possa ser publicada. Mas, para atingir esta finalidade, avaliações e relatórios devem ser elaborados pelo ISBD RG.

Entretanto, decorrente das atuais mudanças que envolvem a catalogação bibliográfica, novos cenários se estabelecem na área, como o de considerar a revisão inicial da ISBD em um passo para uma revisão ainda maior, abrangendo correlação com os componentes do LRM. 

No impacto sobre a estrutura da Norma, pelo modelo, dependerá a tomada de decisões. Assim, com a evolução do LRM, os passos de revisão e atualização devem abranger as etapas:

3- Alinhamento dos elementos obrigatórios ou não obrigatórios, se disponíveis, com o LRM, correspondentes às entidades e/ou relacionamentos;

4 - Alinhamento dos elementos opcionais não alinhados na etapa 1, como atributos da Manifestação ou como relações de Manifestação para Manifestação; mas necessárias para uma descrição completa da ISBD com as entidades, atributos e/ou relacionamentos LRM correspondentes.

Além disso, devem ser tomadas decisões adicionais sobre o desenvolvimento da ISBD como uma implementação do LRM, e se essa tarefa pode ser melhor realizada envolvendo o esforço de outras unidades da IFLA, existentes ou a serem criadas. Prazo previsto para realização da revisão: 2 anos para as etapas 1-2; e 2 anos para as etapas 3-4.

Quanto ao fluxo de trabalho proposto, é salientado que as etapas seriam elaboradas por dois subgrupos distintos, um grupo trabalhando com o conteúdo da ISBD e outro grupo responsável pela estrutura da Norma. Após o WLIC 2018 e aprovação pelo Comitê de Normas da IFLA, as etapas 1 e 2 tiveram início.

Em documento síntese das discussões e de avaliação, realizadas em novembro de 2018, o ISBD Editorial Group encaminhou uma série de perguntas e recomendações preliminares ao ISBD Review Group. Trata do impacto do IFLA-LRM sobre a ISBD; e vincula os atributos da entidade Manifestação com os elementos ISBD correspondentes. Por ser uma avaliação preliminar, o documento indicou a necessidade de estudos mais detalhados, o que deve ocorrer neste período demarcado para a revisão.

Resumidamente, o ISBD Editorial Group manifestou ser favorável à mudança do termo "recurso" para "manifestação", especialmente naqueles casos em que "recurso" é usado para designar uma manifestação. Foi recomendado que a mudança fosse cautelosa e limitada aos casos em que há uma correspondência exata com a definição "Manifestação", no modelo LRM.

Quanto a pontuação, entende-se a necessidade de estudar uma extensão do conjunto atual de sinais de pontuação, em razão do objetivo de compartilhamento de dados não estar totalmente cumprido na atual versão do padrão. A importância também decorre da necessidade de possibilitar o processamento pela máquina e a compreensão pelos seres humanos.

Sobre as instruções de apresentação, que apesar de serem pontos fortes da ISBD e muito úteis no passado, parecem ser pouco relevantes na atualidade. Muitos catálogos on-line não fornecem exibição de registros no formato ISBD.

Neste sentido, recomendou-se que a Norma estabeleça uma distinção objetiva entre instruções para apresentação (pontuação e áreas) e instruções para a entrada de dados. A preocupação é que, com a revisão, a ISBD seja percebida como um padrão moderno, sem risco de associação com os catálogos de fichas. Portanto, a revisão da estrutura da ISBD deve refletir uma duplicidade de ambição, ou seja, promover uma catalogação compatível com o LRM; e apoiar os vários contextos catalográficos.

Como recomendações gerais, foi destacado que há uma lacuna entre as definições fornecidas no texto da Norma e as definições encontradas no Open Metadata Registry (OMR), e que foram usadas para criar o alinhamento inicial da ISBD com o LRM. Recomendou que as definições fossem utilizadas de forma consistente, para fornecer uma única e confiável fonte de informação. 

Outro aspecto apontado, no texto da ISBD, é o fato dos parágrafos serem numerados e não os elementos da norma. Recomendou-se adotar numeração consistente para cada elemento da ISBD, a fim de ajudar a definir melhor o que é um elemento e como ele deve ser apresentado. 

Vale destacar das propostas a questão da definição para o "tipo de mídia" (Área 0 - ISBD) que combina dispositivo de mediação e suporte. Para alinhar com o IFLA-LRM, tudo o que se relaciona com o dispositivo de mediação deve ser orientado para o nível da “Expressão”, enquanto questões do nível da “Manifestação” devam se concentrar apenas no "tipo de suporte". Espera-se, portanto, que o ISBD RG endosse a distinção entre "mídia" (nível da Expressão) e "tipo de suporte" (nível da Manifestação), na Área 0.

Outro ponto citado, foi a Área 6 que combina dois conceitos distintos: “Série” e “Recursos Monográficos Multipartes”; o que é contrário ao preconizado no modelo LRM. Assim, por derem distintos, eles devem ter, cada um, o seu próprio elemento em separado: “Indicação da Série”, e “Indicação dos Recursos Monográficos Multipartes”. Isso seria consistente com a modelagem de recursos contínuos, adotado no LRM. Assim, espera-se que na revisão haja consenso em estabelecer distinção entre “Série” e “Recursos Monográficos Multipartes”.

Apesar dos formatos de codificação estarem fora do escopo do relatório preliminar apresentado, foi recomendado para a revisão, estabelecer contato com órgãos como: o Permanent Unimarc Committee e o MARC21 Advisory Board, para informá-los das mudanças preconizadas para a ISBD, além de preparar futuros alinhamentos e, até mesmo, desenvolver manuais de procedimentos e uso.

Por fim, a revisão da ISBD promete introduzir mudanças significativas na catalogação descritiva e na tomada de decisão do bibliotecário(a)-catalogador(a). Novos conceitos e procedimentos na extração e tratamento dos dados bibliográficos baseados no LRM tendem a redesenhar os objetivos do catálogo e dos processos catalográficos. Uma nova roupagem irá mudar a aparência do catalogador(a). Mas esta roupagem, aliás, deve continuar a ser uma metamorfose.


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FERNANDO MODESTO

Bibliotecário e Mestre pela PUC-Campinas, Doutor em Comunicações pela ECA/USP e Professor do departamento de Biblioteconomia e Documentação da ECA/USP.