MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO


  • Reflexões sobre a Mediação da Informação, englobando aspectos teóricos e práticos.

LEITURA X CELULAR: COISAS ANTAGÔNICAS?

Vejo com frequência textos e postagens que contrapõem a leitura de livros e o uso de equipamentos eletrônicos, em especial celulares. A principal, ou uma das principais críticas é a alienação imposta por esses equipamentos aos que deles fazem uso.

Alienação e concentração podem ser confundidas. Podemos entender como alienação algo que é, na verdade, concentração. O oposto também é verdadeiro.

O que vale para os equipamentos eletrônicos, também vale para o livro. Posso entender alguém lendo um livro como extremamente concentrado ou como alguém que se alienou do mundo, fugindo, pela leitura, de uma vida indesejada, sofrida, triste.

Por que o uso de um celular é sempre apresentado como ruim? Todo excesso é prejudicial – embora seja difícil determinar quando algo pode ser entendido como excessivo. A leitura de livros em excesso também não deve ser considerada prejudicial?

A pergunta que faço aqui é: por que escolher uma das duas coisas? Por que escolher entre leitura de livros e uso de celular?

Defendo que deva existir um convívio entre o livro e os equipamentos eletrônicos. Um não pode ser entendido como melhor ou pior que o outro.

Há muita coisa ruim nos celulares? Também há muito conteúdo ruim nos livros.

Gutenberg inventou – não é bem verdade essa invenção, pois os chineses já conheciam esse processo – a imprensa com uma finalidade econômica. Ele precisava sobreviver, mas, independentemente desse seu interesse, o livro democratizou, em parte, o acesso ao conhecimento. Digo em parte, uma vez que ainda hoje o número de analfabetos ou analfabetos funcionais é muito grande, sem possibilidade de apropriação do conhecimento pela leitura. São os não usuários. Há pesquisas que apresentam um quadro aterrador: 75% da população brasileira pode ser identificada como analfabeta funcional, ou seja, aqueles que sabem ler, mas não conseguem compreender, em um pequeno texto, algo solicitado. Por exemplo, alguns analfabetos funcionais não conseguem informar, em um classificado, o local em que devem se apresentar para concorrer a uma vaga de emprego.

A leitura precisa ser repensada. Com o uso de equipamentos eletrônicos temos uma nova forma de leitura?

A quantidade dos que fazem uso das redes, como o Face, o Twitter e o WhatsApp, é muito grande e eles exigem e determinam um tipo de leitura mais rápida, não necessariamente sequencial, muito vinculada aos acontecimentos do dia a dia, voltada para slogans etc.

Historicamente, a leitura esteve condicionada ao formato do suporte da escrita. Todas as vezes em que esse suporte se alterou, também se modificou a forma de leitura. A leitura, independente do suporte, também se modificou. Um exemplo é a leitura silenciosa, se opondo à leitura em voz alta.

Por que não pode ela se modificar mais uma vez? Um novo modo de ler não significa excluir formas tradicionais de leitura. Também não significa eliminar tipos de suportes, como o livro, por exemplo.

Um novo tipo de leitura deve ser abrangente, abarcando formas mais tradicionais (para não dizer mais antigas) e outras mais recentes.

Nós, os que amamos e defendemos os livros em seu formato mais tradicional (esse formato tem sua origem em Gutemberg, portanto nem tão antigo assim, uma vez que pouco mais de 500 anos representa quase nada em uma história que remonta a 3000 anos antes de Cristo), não somos saudosistas a ponto de desconsiderar essas novas formas de leitura. Não somos como os ludistas nem como os quebra-quilos ou mesmo como os que se opunham à vacina na época de Oswaldo Cruz (cá entre nós: 115 anos depois, parece que a revolta contra a vacina está de volta).

Os e-books, presentes e acessíveis em computadores, tablets, celulares e aparelhos específicos para leitura, são “menores”?

Os equipamentos informacionais terão que se adaptar e lidar com essas leituras, tanto tradicionais como recentes. Qual biblioteca, por exemplo, pode não oferecer serviços com base ou dirigido para celulares? Eles serão diferentes, mas terão uma base comum, terão uma concepção comum.

Nosso desafio é o de criar esses serviços, mas, especialmente, é o de não criarmos oposição entre todas as formas de leituras existentes hoje – e outras que irão surgir no bojo das constantes e rápidas transformações da tecnologia.


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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.