MEDIAÇÃO DA INFORMAÇÃO


  • Reflexões sobre a Mediação da Informação, englobando aspectos teóricos e práticos.

MEDIAÇÃO E MEDIADORES DA INFORMAÇÃO NAS BIBLIOTECAS PÚBLICAS

A Biblioteca Pública deve se constituir em espaço de resistência informacional. Suas ações e práticas, no âmbito político, econômico, social, cultural e educacional devem ter como base a informação.

As informações armazenadas e disseminadas pelas bibliotecas públicas são as veiculadas pelos órgãos, instituições e organizações oficiais e comerciais, mas, prioritariamente, são aquelas que não fazem parte dos interesses dos dominadores, aquelas que representam interesses e necessidades das classes trabalhadoras, das classes marginalizadas, das classes subalternas, das classes dominadas, das classes que não possuem voz. Entre as principais responsabilidades das bibliotecas públicas está a de dar a voz aos que não a têm; entre as principais responsabilidades das bibliotecas públicas está a de permitir que o povo possa reconhecer suas necessidades e interesses e transformá-los em uma voz própria, autêntica, não camuflada e escondida na voz dos dominadores; entre as principais responsabilidades das bibliotecas públicas está a de permitir que o povo reconheça que hospeda em si os dominadores. 

As bibliotecas públicas devem ter consciência de que seu acervo é quase todo constituído do saber produzido pelas classes vencedoras; devem ter consciência de que preservam o conhecimento dos dominadores e deve contrapor a ele o conhecimento proveniente dos vencidos, das classes que, numericamente são maiores, mas cativas de um discurso hegemônico, oriundo de uma minoria.

É preciso que as classes populares percebam que são sujeitadas; que a parcela a elas destinada da riqueza produzida pela nação é ínfima, é uma migalha; é preciso que as classes populares percebam que vivem de migalhas e que isso pode ser combatido. As bibliotecas públicas podem e devem estar presente nessa busca pela consciência das classes populares a partir da informação, mas não da informação hegemônica, intensamente presente nos órgãos da mídia comercial que apenas veiculam os interesses de seus donos, ao contrário, é preciso trabalhar com as informações populares, com a documentação popular.

É preciso resgatar termos perdidos na história das bibliotecas brasileiras, termos soterrados sob os interesses de uma classe dominante minoritária com a qual as bibliotecas públicas fizeram um pacto tácito: bibliotecas populares, informação social, informação cidadã, documentação popular. É preciso não só resgatar esses termos, como também, e principalmente, as concepções que carregavam, os conceitos e ideias dos quais estavam prenhes. 

A biblioteca pública deve ser o centro informacional da comunidade que atende; deve ser o espaço a que todos recorrem quando há uma necessidade informacional, mas não apenas aquela tradicionalmente aceita, ou seja, a vinculada à satisfação de uma pesquisa escolar ou para atender uma curiosidade ou relacionada a um desejo recreacional ou, ainda, para atender a um problema profissional; também deve atender, e prioritariamente, as necessidades informacionais do cotidiano, do dia-a-dia; deve atender as necessidades informacionais voltadas para a cidadania; atender as necessidades informacionais que permitem conhecer, reconhecer e exigir os direitos dos cidadãos.

O bibliotecário deve ser um mediador da informação, ou seja, aquele que interfere na busca e apropriação da informação por parte do cidadão; aquele que constrói o acervo da biblioteca em que atua a partir dos interesses e necessidades dos cidadãos da comunidade a quem presta serviços; seu vínculo deve ser com essa comunidade e não com as classes que a subjuga. O bibliotecário, consciente de sua atuação como mediador da informação, deve evidenciar que o conhecimento presente em seu acervo ou nos locais tradicionais de recuperação de informação, é fonte de dominação, é empregado como forma de dominação. 

O bibliotecário mediador da informação é aquele que se envolve com a comunidade, é aquele que tem uma militância, mesmo que não formal, mesmo que não explícita. O bibliotecário mediador da informação é aquele que vai além de um mero funcionário, de alguém que cumpre sua jornada de trabalho de maneira automática e vazia, que aspira apenas à aposentadoria (que, qual horizonte, se afasta quanto mais nos aproximamos). O bibliotecário mediador da informação é aquele que sabe que seu trabalho pode levar a transformações, pode levar a cada um da população a se reconhecer como cidadão, com deveres, mas com direitos que devem ser exigidos e exercidos. O bibliotecário mediador da informação é aquele que não reduz seu trabalho à mera oferta de suportes físicos da informação, mas que estende esse trabalho até a apropriação da informação, até o entendimento e compreensão das informações oferecidas. O bibliotecário mediador da informação é aquele que interfere na informação, que interfere no conhecimento. O bibliotecário mediador da informação é aquele que sabe que a informação não dirime dúvidas, não cobre lacunas cognitivas, ao contrário, sabe ele que a informação cria novas dúvidas, que a informação cria conflitos. E os conflitos exigem novas posturas, novas posições, novas reflexões, novos entendimentos do mundo.

O bibliotecário mediador da informação faz uma opção pelos pobres, pelas classes trabalhadoras, pelas comunidades subjugadas, pelas classes dominadas, pois essas classes dominadas também o são informacionalmente ou são dominadas a partir, também, de uma ideologia da informação, de uma ideologia do conhecimento. 

O bibliotecário mediador da informação não é aquele que se entende como quem sabe, preenchendo de conhecimento o ignorante, não, o bibliotecário mediador da informação é aquele que está junto, que ensina e aprende com sua comunidade.

Em suma, a biblioteca pública mediadora da informação e o bibliotecário mediador da informação são os que compreendem seus trabalhos como uma interferência na apropriação da informação; são os que compreendem suas ações como criadoras de conflitos; são os que compreendem suas responsabilidades voltadas para a consciência da cidadania; são os que compreendem todo o seu fazer, todo o seu trabalho, todas as suas ações como transformadores, como possibilitadores de formas diferenciadas de entendimentos e compreensões do mundo.


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OSWALDO FRANCISCO DE ALMEIDA JÚNIOR

Professor associado do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina. Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UNESP/Marília. Doutor e Mestre em Ciência da Comunicação pela ECA/USP. Professor colaborador do Programa de Pós-Graduação da UFCA- Cariri - Mantenedor do Site.