LITERATURA INFANTOJUVENIL


MALBA TAHAN: A ARTE DE LER E CONTAR HISTÓRIAS: LIVRO ANTIGO OU MODERNO?

O livro A arte de ler e contar histórias de Malba Tahan foi editado pela primeira vez em 1957. Trata-se de um manual instrucional coerente com a prática pedagógica da época.

É importante destacar que este livro contém dicas valiosas para os narradores de histórias e que, se aproveitadas, tornam as atividades na escola mais enriquecidas, além de cumprir o objetivo de motivar o aluno à leitura.

Mesmo correndo o risco de ser prescritiva, trouxe algumas ideias de Malba Tahan contidas nesse livro; minha intenção foi evidenciar as qualidades de um narrador e acrescentei meus comentários:

 

Qualidade

1o) Sentir, ou melhor, viver a história: ter a expressão viva, ardente, sugestiva (p.29)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador precisa sentir alegria e entusiasmo na narrativa, ou seja, narrar com vivacidade para não ser monótono.

Meus comentários

Penso que o primeiro passo para que o narrador vibre durante a narrativa, é gostar do texto escolhido. Além disso, a vivacidade é fundamental na narração de histórias, pois nada adianta excelente memória, escolha acertada de um texto, um ambiente sem ruídos, tonalidade de voz, postura corporal adequada, se o narrador está desinteressado, disperso e com má vontade.

 

Qualidade

2 o) Narrar com naturalidade, sem afetação (p.29-30)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador não deve usar linguagem rebuscada, estilo empanado com “deploráveis lantejoulas”.

Meus comentários

Penso que a artificialidade é facilmente perceptível até pelo espectador mais distraído. Os diminutivos e os aumentativos, o uso de palavras contendo uma formalidade exagerada, pode tornar a narrativa enfadonha e desinteressante.

 

Qualidade

3 o) Conhecer com absoluta segurança o enrêdo (p.30-31)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador deve se preparar rigorosamente antes de narrar as histórias para não preencher os esquecimentos com “então foi”, “não me lembro mais” ou “como foi mesmo?” “Aquele que quiser narrar sem dominar o texto praticará a leviandade.”

Meus comentários

Penso que o preparo minucioso do narrador é fundamental para que ele tenha segurança do texto a ser narrado. O improviso é recomendado apenas àqueles que tenham criatividade abundante e um extenso e diversificado repertório de textos.

 

Qualidade

4 o) Dominar o auditório (p.31)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador terá êxito se evitar elementos perturbadores (abrir e fechar de portas, salas vizinhas ruidosas, conversas cochichadas), que quando excessivos e repetitivos irão atrapalhar o interesse pela narrativa.

Meus comentários

Penso que, em geral, o domínio do auditório é uma consequência da interação narrador-espectador. O ideal é que isso ocorra desde o início da narrativa, portanto a prática de usar as tradicionais fórmulas – Era uma vez... No tempo em que a galinha tinha dentes..., são sempre bem-vindas. Além disso, no decorrer da história, prenda a atenção do espectador olhando diretamente em seus olhos. Sugerimos a confecção de placa para ser colocada na porta da sala com solicitações como: “Pare: aqui tem histórias”, “Volte mais tarde, agora é hora de histórias”.

 

Qualidade

5o) Contar dramaticamente (sem caráter teatral exagerado) (p.32)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador necessita saber dosar seus gestos e os movimentos do corpo, pois o excesso desvia a atenção do texto narrado.

Meus comentários

Penso que o ato de contar histórias se diferencia de uma encenação teatral, então não exige todos os aparatos do teatro. Em geral, o narrador está sozinho, portanto, o espectador fixará seus olhos nele e o uso exagerado de levantar, abaixar, balançar, esfregar as mãos, por exemplo, é desnecessário, pois isto será facilmente percebido pela plateia. Evidentemente que um gesto brusco deve ser usado quando tem um significado no texto.

 

Qualidade

6 o) Falar com voz adequada, clara e agradável (p.32-34)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador deve adequar a voz ao gênero da narrativa, com expressividade e agradabilidade, modulando-a conforme a necessidade. Cuidar da respiração, articulação e timbre.

Meus comentários

Penso que a voz é o elemento mais expressivo da narrativa e se ela for usada com segurança, tranquilidade e flexibilidade o narrador terá êxito.

 

Qualidade

7 o) Evitar ou corrigir os defeitos da dicção (p.34-35)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador deve cuidar de dois graves defeitos: tartareio (omitir sílabas) e a balbuciência (repete vocábulos e arrasta com lentidão as palavras – e...e...e...).

Meus comentários

Penso que é recomendável o máximo de cuidado no momento da narrativa, para que as histórias não sejam entrecortadas com expressões viciadas, repetições cansativas e incômodas.

 

Qualidade

8 o) Ser comedido nos gestos (p.35-36)

Síntese das ideias de Malba Tahan

O narrador deve evitar exageros nos gestos, tanto na repetição para não ficar monótono, quanto no excesso que pode desviar a atenção.

Meus comentários

Ilustro o exagero nos gestos com um exemplo clássico de uma contadora de histórias que ao narrar, fazia tanto ruído com suas inúmeras pulseiras que as crianças hipnotizadas com aquele balé, não prestavam atenção na história.

 

Qualidade

9 o) Emocionar-se com a própria narrativa (p.7-49)

Síntese das ideias de Malba Tahan

Para essa qualidade, o autor faz oito recomendações:

- Impor silêncio ao auditório, ao começar a narrativa (solicitar o silêncio com simpatia);

- Não romper o fio da narrativa com conselhos e admoestações (caso perceba inquietude no grupo, opte por utilizar histórias com interferência ou histórias com jogos);

- Evitar os tiques, cacoetes e estribilhos (evitar repetições corporais e vícios na linguagem como: né? não é? aí, então...);

- Ter na mão uma ponteira (o narrador pode utilizar o recurso de uma flecha, varinha, régua, leques para apontar caminhos, pássaros voando, castelos distantes; porém com moderação);

-Tirar partido de qualquer anormalidade que ocorrer durante a narrativa (se um ruído ou um objeto derrubado dispersar a atenção, o narrador pode reverter a situação acrescentando o fato ocorrido na narrativa);

- Dispensar aos ouvintes o mesmo índice de atenção – Tratá-los com igual simpatia e com absoluta camaradagem (não ter ouvinte predileto, todos precisam se convencer que o narrador está narrando unicamente para ele);

- Não se irritar nem se perturbar com a presença de um ouvinte “tirolês” (indivíduo indiferente, sem reação), este também deverá ser conquistado.

- Resolver, de pronto, as questões ou dúvidas sugeridas, durante a narrativa, por um ouvinte curioso ou desajustado (narradora não deve se mostrar irritada ou zangada, deve utilizar uma energia branda, procurará vencer a dificuldade sem perder o fio da história).

Meus comentários

De todas as recomendações apresentadas pelo autor quero me voltar para frase inicial do item 9º. “emocionar-se com a própria narrativa”. Faço isto para destacar que a escolha da história a ser narrada é fundamental, pois a história terá que trazer encantamento, primeiramente ao narrador. Ele precisa gostar do texto a ser lido e saboreá-lo como prato principal de uma refeição preparada com zelo e carinho.

Para concluir, qual a resposta para o título deste texto – A arte de ler e contar histórias: livro antigo ou moderno? Penso que a melhor resposta é: vamos deixar de lado esta dicotomia – antigo e moderno (cruzes, a dicotomia anda rondando nossas vidas!) para destacar o que é mais importante, isto é, narrar histórias é algo maravilhoso e que só se aprende na prática cotidiana. Para ilustrar acrescento aqui uma experiência que Malba Tahan vivenciou na minha amada Londrina.

Já havia iniciado a narrativa: “Era uma vez um rei que tinha dois filhos. Êsse rei era bondoso e muito estimado... Nesse momento ouviu-se, na rua, fortíssima explosão, provocada por pesado caminhão. Os meninos mostraram-se apreensivos. Sem fazer o menor comentário ao caso, prossegui: “esse rei era tão calmo, tão valente, que um estouro, como esse que acabamos de ouvir, não o amendrotava (sic!)..." Os meninos sorriram e permaneceram em silêncio, ouvindo a história até o fim. (TAHAN, 1966, p.41).

 

Viva para Malba Tahan!

 

Sugestão de Leitura:

TAHAN, Malba. A Arte de ler e contar histórias. 5.ed. Rio de Janeiro: Conquista, 1966.


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SUELI BORTOLIN

Doutora e Mestre em Ciência da Informação pela UNESP/ Marília. Professora do Departamento de Ciências da Informação do CECA/UEL - Ex-Presidente e Ex-Secretária da ONG Mundoquelê.